quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Quando me é Lisboa




Chego a Lisboa. Cedinho. E o calafrio de Pessoa me percore a espinha, enquanto o automóvel circula do aeroporto ao hotel. Lisboa que acorda mais cedo que outras cidades do mundo. Gosto desta cidade que tem pedras brancas, cheira a pinho e a alfazema. E virou cosmopolita. Vários cartazes falam de arte acontecida e por acontecer. O trânsito continua bárbaro e o taxista ensina-me os últimos palavrões da língua portuguesa. Os taxistas de Lisboa davam um grande diccionário de palavras escabrosas, diga-se. Refaço, mentalmente, os meus afazeres. Escrevo na minha agenda Moleskine que Lisboa é o nosso alter ego urbanístico. Os arquitectos e os urbanistas crioulos (mas eles existem?) me matam. Será? No hall do hotel, a florista, que já me trata por tu, quer saber das flores de Cabo Verde. Pergunto-lhe sobre um poema de Alexandre O´Neill e ficamos quites. "Esse cabo-verdiano é meio maluco", estará a pensar. "Mas eu gosto de rosas, crisálidas e margaridas", remato, com elegância. Não antes sem aprender que "chiques mesmo são as orquídias, meu caro". Faço um print out de uns versos de O' Neill e ofereço à senhora. E deixo-vos, como desse rosmaninho que me sobe à lembrança (de tudo, de tudo, meus queridos), um nadinha desses belos versos:


(...)

Há palavras que nos beijam

Como se tivessem boca,

Palavras de amor, de esperança,

De imenso amor, de esperança louca.

(...)


Fica também na Moleskine: Lisboa é um teatro que me insunua e me denuda em pleno palco, um fado que me reabre o coração e me aperta o nó das lágrimas como as palavras que nos beijam. A sombra da minha mãe e o lusco-fusco da minha infância. Uma Fonte Luminosa e umas crianças ruidosas. Traquiníssimas. Éramos nós noutros tempos de Lisboa...

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