segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

As cidades & os versos


Praia de Santa Maria

Gosto de regressar à cidade da Praia, depois de uma temporada no estrangeiro. A aproximação do avião da TACV (que já deixou de ser o “prazer de viajar bem”) sobre a baía da Praia de Santa Maria me deixa sempre em êxtase. A malha urbana desta cidade cresceu e caminha, como uma grande célula, para transbordar o município. Ela torna-se, a olho vivo, uma metrópole. Com os seus problemas e oportunidades. Sou capaz de identificar cada lugar do centro histórico e das envolventes, imaginando as intervenções necessárias nos seus bocados. Assim, num olhar do alto, fica-se com uma visão de conjunto. Um tanto utópica, diga-se em verdade. Mas, já em terra, o relâmpago é outro. Exigindo de mim uma procura qualquer. Quiçá algo mais tangível e imediato. Com toda a causa…

Reflexões bracarenses

Estive há dias em Braga, cidade ancestral. Atravessar uma parte de Portugal, de Lisboa a Braga, com paragem obrigatória pelo Porto, serviu para pensar em muita coisa. Primeiro, confirmar alguma identidade comum, aquela que nos obriga à pertença de hábitos e costumes. Segundo, tomar a consciência das nossas diferenças e ver que isso é uma mais-valia nas nossas relações. E terceiro, fazer imperiosamente novos amigos e novas alianças, já que o mundo sendo grande, torna a terra pequena. Plano é o mundo…

O Mundo é plano

Falando nisso, aconselho a todos a leitura do livro “O Mundo é Plano”, de Thomas L. Friedman. A desmistificar a crítica sistemática de alguma esquerda de serviço, Friedman mostra que os países – como tem feito Cabo Verde, nos últimos anos, precisam ter uma inserção mais dinâmica na economia planetária. A globalização não gera mais pobreza e injustiça. Pelo contrário, ela facilita a vida aos pobres que queiram concorrer no mercado aberto. O que o livro pretende demonstrar é que o mundo está a ficar mais igualitário e nivelado, concedendo aos países atrasados mais oportunidades para entrar em áreas onde antes lhes era impossível participar…

Cidades cabo-verdianas

Tudo está no seu lugar, graças a Deus, como naquele velho samba, inclusive o anúncio de virarem cidades todas as capitais dos municípios de Cabo Verde. Com este upgrade político-administrativo, Cabo Verde urbaniza-se radicalmente. Ou virtualmente. Como esta última me apanhou de surpresa, meio com as calças na mão, passe a expressão, não dou palmas, nem faço a vez de Velho do Restelo. Farei votos para que tudo, à maneira desse samba, continue no seu lugar…

Versos de Fortaleza
Das dezenas de e-mails que recebo quotidianamente, metade vem com dizeres e versos. É uma troca generosa e reconfortante com os meus amigos pelo mundo. Ora, recebi, de Fortaleza, estes versos de Regina Lima Verde: Deixa que os teus dedos percorram as minhas terras e reconheçam o que ainda de belo tenho em mim: os meus rios, as cascatas. / Permite que os teus navios ancorem nos meus portos, teus portos e que amarras fortes os mantenham presos. /Insiste que os meus acidentes sejam os teus caminhos, pois os meus vulcões esperam por explosões.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

12 palavras

Pablo
Denzel
Mother
Cabo Verde
Praia
Santiágu
Love
Abo
Albatroz
Vida
Arte
Lus

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Racismo não

Segui, com horror e indignação, a linguagem racista do deputado da Assembleia Nacional, António Pascoal dos Santos. Aguardo, como qualquer cidadão nacional, que o ilustre deputado, eleito e sustentado com a nossa cidadania, faça retratação pública pela verborreia e que o Partido, que o tem em bancada, se demarque de tamanha ignomínia. Enquanto isso não acontece, é preciso que os nossos deputados não se arvorem em deuses de esquina, nem extravasem tamanha ignorância. A sociedade precisa ensinar aos políticos de que a Política não pode tudo. Não pode transbordar as margens da ética definidas pela sociedade e pela cidadania. Há sentimentos e intenções que não têm espaço num Estado de Direito Democrático. Pascoal não…

Soneto sem nexo



Não direi agora um poema hermético para te falar de amor,
Quando, com a pequena gramática das horas, o não dito faz as vezes de um beijo,
Ou mesmo, assim escorreito, és de soslaio o ardil com que o tempo é lapso,
Relapso canceroso como come a carne o simples desejo na fogueira;
Nem direi aqui, com todo o nexo, o soneto dos teus seios em silício,
O ver-te descoberta, apartada da trincheira em que vais à profana guerra,
O pensar-te folha, verde folha, a de leve e de breve, quase fotossíntese,
Em senso e em sexo, o sensual de te pensar pelos véus de cada noite;
De nada vale, tal quão silenciado como seviciado, desejar a lua,
Se tu, meio nua, seminua ou inteira, cheia de vazio, és flor sem cor,
Ou, se tanto, cor sem flor, rosa-dos-ventos e odor das brisas…
Quiçá assim, em simples dizeres sem poesia, nem metáforas construídas,
O ser, no puzzle das coisas, a simples peça que se aguarda,
O desmontar esse brinquedo, esse ruído, fala dos gâmetas, trombetas quase…
Filinto Elísio

Poeta de certo madrigal




Quiseste-me poeta de certo madrigal,
Vitaminado de sintaxe, realejo e versejo
Semântico em mim próprio, alado cavaleiro
Ou psicadélico e mensageiro, filho da pátria…

Quiseste-me verso, esquecido do perverso,
Homem novo, sua toxicodependência, o texto
E seu contexto de máscara, de uma poesia
Que não espera pelo vento, fará da cotovia…

Todavia, sou doutra leira que não esta
De alaúde romântico e verbo metafísico
Sou das estradas sem eira, nem beira
Apartadas dos cristais e seus desvarios…

Um pouco esse rouco de algumas vozes,
Aquelas de percalços e sombras dissolutas,
Um pouco essa coisa viscosa e lacrimosa,
Escoante dos insones, deserdados e aflitos…


Filinto Elísio

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

COMUNICADO FINAL



Devido ao extravio, nos últimos dias, da sua porqueira (como se pode constatar por imagens de postais dali enviados) situada algures na zona saloia, arredores de lisboa, de uma lunática porcina, portadora duma anomalia altamente contagiosa, as autoridades competentes destacaram uma força de captura e exterminação composta por uma equipa cinotécnica (para detectar o mau cheiro), um psiquiatra (para diagnosticar os sinais de loucura galopante) e um especialista em ondas zoófilas (para rastrear o IP, vulgo impulso porcino).

Depois de apuradas análises, conhecida que é a sua compulsão para a transmutação, chegando mesmo ao ponto de encarnar um ente real conhecido de todos, um médico caboverdiano colunista do jornal A semana online, a força detectou que encarnou nos seguintes clones (sem prejuízo de desanexar da lista, com as respectivas escusas, como manda a grandeza moral, se alguns destes vierem a provar existência humana real, embora seja manifesto o grau de parentesco): A.S. Magro, Filomena Teixeira, Undertaker, Undertaken, Sindicatos, Amílcar, Sabichão, Sampadjudu refilon, Frankelina, I. Faria, L. Semedo, Sodade, Consuelo Betancourt. (A lista não é exaustiva, dado o escasso tempo que a força teve para analisar a quantidade de indícios, isto é, os dejectos ruminados e expelidos nos últimos dias pela perpetrante).

No entanto, segundo notícias confirmadas, a dita foi encontrada já cadáver na mata de Monsanto, onde tentara refugiar-se após feroz perseguição que lhe fora movida por um pitbull de nome Tavares, a quem tentara atirar, numa das suas encarnações (desta feita um negro angolano e uma mestranda em lérias), uma dose da sua costumeira porcaria.

Pela pestilência exalada, confirmou-se tratar da dita, embora com esse curiosíssimo pormenor: apesar do manifesto estado de rigor mortis, a carcaça continuava a emitir uns estranhos sinais IP – impulsos porcinos – que, logo que decifrados e traduzidos para linguagem humana corrente, consistiam no seguinte: «eu sou uma porca, sou uma porca, sou uma porca, mas não estou morta».

Consta que, apesar do valoroso gesto em prol da salubridade pública, o pitbull exterminador foi saudado por muito poucos, pois, apesar da carcaça ter sido mandada para a incineração, alguns nativos temerosos receiam que algum clone tenha sobrevivido, ou que regresse em forma de harpia.

Choupana da Reinação, dia do Carnaval do ano da graça de 2008
Assinado (na ausência do Rei-momo) pelo seu fiel mordomo

José Luiz Tavares