quinta-feira, 31 de julho de 2008

Hiroshima


A bomba atómica sobre Hiroshima foi prova maior da vileza e da desumanidade. Foi há 62 anos. Mas a reabilitação desta cidade denota a genialidade humana. Homem, esse Desconhecido!

Ressaca do Silêncio

A noite foi feita para comer (isto é, para amar de forma carnívora, lentamente canibal, no calibre da loucura):
Uma lua vermelha – clítoris da felicidade

A leveza da escuridão – sombras do prazer esvaídas no repentino faiscar da navalha e do insulto

A longa espera das virgens – explodindo orgasmos tingidos de dor

A incrível alegria das putas – livres na penumbra da dança em exuberante apoteose do cio
e do aturdido rodopiar do eros

O amanhecer dos burocratas - com o sol na patética e ciclotímica rotação da rotina

A ressaca do silêncio – tardia luminosidade do dia entrando abruptamente pela fenda do êxtase
e da remordida memória das trevas

(Parêntese aposto para o apaziguamento dos defensores da represtinação do atentado ao pudor e de outros crimes contra a moral, a religião e os bons costumes: os abstémios são geralmente execrados
e os sóbrios, ostracizados e impiedosamente trucidados pela ironia, confinam-se usualmente
ao implacável crepitar do pudor do remorso e da assassina memória das loucuras não consumadas)

Lisboa, 2003/Julho de2008
(versão refundida do poema homónimo constante do livro À Sombra do Sol, volume II, Praia, 1990)


José Luis Hopffer Almada

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Um mar que inexiste


Relâmpagos em Braga

Aqui não há mar, só há cão. Lá estás tu, meu Poeta, a pensar que as crianças, com mães pelos braços, são autênticos relâmpagos. Entrementes, Louis Armstrong, mais conhecido por Big Louis, o buldogue na esquina, começa a latir, mas depois pára e instala-se uma espécie de silêncio. Já nada sobra do seu vozeirão. Apenas o barulho espraiado de um mar que inexiste…

Uma questão de beleza

Termino de ler, às tantas pela madrugada, “Uma Questão de Beleza”, de Zadie Smith. Não tanto pela narrativa, que é bem composta e fluida, mas, sobretudo, pelos retratos (de Cambridge, Boston e arredores), que me são familiares, gostei do romance. Comprei o livro, na Byblio, em Lisboa, para oferecer e levei-o a Braga. Li-o, a cuidados, mas com sofreguidão. O Outono em Nova Inglaterra. Fall...

O stopover no Porto

Dizes-me que os gregos antigos assistiam a um teatro de máscaras (o dos “hupókrates”, de onde derivariam “hipócritas” destes dias) e que os actores, assim protegidos, estavam livres para dizer o indizível.

Lisbon Blues

O meu amigo Marc pega no contrabaixo e toca-me, em primeira mão, uma composição inédita. Lisbon Blues é o nome da canção. E tu danças, ágil e graciosa, como a borboleta que bate as asas na China…

Budas Ditosos

Leio o que diz Rui Knopfli, sobre Jorge Amado. Irascível, Knopfli diz que o baiano é um péssimo escritor e um aldabrão de feira. Em verdade, esse escritor moçambicano acaba de proferir mais uma asneira grossa. A blasfémia, mais do que a luxúria, deveria ser catalogada na lista dos Sete Pecados (se não Capitais, seguramente artísticos). Falando nisso, outro baiano, João Ubaldo Rodrigues, autor de "A Casa dos Budas Ditosos", ganha (com toda a justiça, diga-se) o Prémio Camões 2008…

Singapore’s Divide

Antes de “descer” de Braga a Lisboa, vejo, pela estação televisiva Al Jazeera, uma excelente reportagem sobre o incremento da pobreza em Singapura e o da riqueza em Angola. À primeira, espantam as duas novas realidades. Mas, à segunda, não se justifica que os espantos sejam espasmos, convenhamos…

sábado, 26 de julho de 2008

Chinua Achebe, Wine O'Clock & livraria Nho Eugénio


1.
Graças ao meu amigo Sílvio Baptista (o tal de Fala Coração, da CV Móvel, já viram) conheci a livraria Byblio, em Lisboa. Dei de caras ao dístico de Jorge Luis Borges que, em Torre de Babel, definia a biblioteca como uma espécie de Paraíso. Orgulhoso, lembro ao Sílvio que sou bibliotecário, com especialidade em ciência de informação. A administração, que se pretende pós graduação, é apenas uma prótese. Sou um homem dos livros. De os ler, de os escrever e de os manusear “com amor táctil”, no dizer de Caetano Veloso. Para além de Uma Questão de Beleza, a que me irei referir na postagem próxima, também compro o romance Quando Tudo se Desmorona, de Chinua Achebe, e Prosa Completa, de Woody Allen. Este último ainda não li. Guardo-o para este fim-de-semana, como um gourmet em estado de guloso…
2.
Quanto ao Quando Tudo se Desmorona, terá sido Nelson Mandela (o Divino Mandela) a dizer isto: “Na sua companhia, os muros da prisão caiam”. Ele referia-se também a Chinua Achebe. Tive a ventura de ter lido quase todos os livros desse nigeriano, brilhante contador de histórias, menos Quando Tudo se Desmorona. Li-o agora. Fez-me sair da platónica caverna, onde a luz é rara e os deuses são de esquina. Ele rendilha o romance com luz própria, de um telúrico incomum. Universal por ser autêntico. Profundo por ser ele…despeitadamente. Quando Tudo se Desmorona, é uma verdadeira incomodidade para uma certa intelectualidade que se masturba em torno da vitimização e da folclorização.
3.
Defronte à livraria Byblio, uma casa de vinhos interessante. A gerir os clientes, como uma cicerone graciosa e competente uma bela romena. Ela parecia saber tudo dos vinhos. E da beleza. Wine O’Clock…só poderia!
4.
Inaugura-se, na Achada de Santo António, uma livraria chamada Nho Eugénio. Abrir uma livraria na cidade da Praia, mais que evento, é uma ousadia cultural. Dou as boas-vindas aos promotores, com promessas de cliente assíduo. É uma espécie de Paraíso

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Man in the mirror

I'm starting with the man in the mirror
I'm asking him to change his ways
Micheal Jackson. Man in the Mirror
Não tomei tento à fase da lua, mas hoje estou “estranho”. Acho que é do tempo da chuva. Quando amanhece em neblina, fico mais oblíquo. Desvio-me do quotidiano. Só regresso para dar pequeno-almoço aos meus filhos. Estes são a minha realidade. Ultimamente, devido ao enorme espelho do meu quarto, olho-me muito e mais demoradamente. Vejo-me reflectido e invade-me uma sensação nova, que não a da egolatria. Ou é o reflectido que olha para mim? Não interessa. Tal como em certa matemática, a inversão não altera a ordem dos factores. Ou altera? Tanto faz. O reflexo mexe comigo e resplandece a minha solidão existencial. Ó cambada, ó turbilhão de gente, estou só, irremediavelmente só, ouviram? Estar só é poder andar de tapete voador sobre os labregos, sobre o Café Sofia e topar que a barulheira da cidade não passa de um silêncio ulterior. Ou, tal qual aquele invisível, de Os Dados Estão Lançados, de Jean-Paul Sartre, em que o protagonista gritava, gesticulava e suplicava, sem que ninguém lhe desse a mínima. Nem com GPS, se chega a Xangai. Nem à boleia do Autocarro # 20. Olho, pela CNN, a preparação dos Jogos Olímpicos de Pequim. Qualquer dia, peço ao pessoal do Tribunal Internacional que formule um mandato contra a vizinhança que joga o lixo fora dos contentores. Não me refiro à Sérvia. Tão pouco é piada sobre Guantanamo. Em Safende e arredores, a situação interpela aos senhores dos Direitos Humanos. Mas falava do meu espelho. Olho-me e estou biodegradável. Este gajo não é um filet-mignon, caramba. Mário Fonseca, poeta desta minha cidade, escrevera nuns versos que “viver/ devia ser/ até 20”. É o mais existencial dos poemas de Mário Fonseca. Ontem, sonhei com a tal bomba termonuclear, que já não poderá a acabar com a Esplanada da Praça Alexandre Albuquerque. Esta foi destruída pela incompetência municipal, frustrando qualquer intenção poético-terrorista. Faz neblina e Nero teve as suas razões para incendiar Roma. Estou “estranho”. Apagão da Electra, falta de água, mosquitos por todo o lado, cheiro à merda depois da chuva de ontem, o ignorante sindicalista na TCV, os parasitas e os oportunistas, os taxistas e os hiacistas, e esse energúmeno a jurar que é Verão…isso tudo só poderá ser uma brincadeira de mau gosto. Got you, baby. Mas, como todos, dou gargalhadas. Palmas que esta peça há-de entrar na próxima estação teatral do Mindelact. Estamos ainda a tempo de apresentar O Espelho, ó João? Parece que é neblina no universo inteiro. Como todos, sei que metade não amou hoje. Como todos, só 10% faz realmente amor e um ½ desse contingente acredita nos nossos deuses de esquina. Como todos, caminho para o crepúsculo. Com hora marcada para apagar…

Sinal di Tenpu

(pa louva Dr. Azágua i se puema “TENPU”)
//
Sin!
Txeu tenpu pasa
sen sinal di tenpu
rabiskadu pa nho
al ser falta di tenpu
//
Xo, tenpu bidjaku!
Dexa-l ku tenpu
pa el ten tenpu
brinka ku tenpu
nina-nu kurason
dentu tenpu
//
Si falta-nho tenpu
skrebe-m na tenpu
N kunpra-nho tenpu
la fin di tenpu
//
Aian!
Tenpu d’azagua
pa Dr. Azágua
tenpu e poku
- linpa lugar na tenpu
simia dentu tenpu
ka monda fora tenpu
nen ramonda antis tenpu
ki fari korta dipos tenpu
tudu na se tenpu sertu!
//
Anpugo!
Diskulpa-m
dexa-m sumara tenpu
tenpu dja muda
sinal tenpu-l txuba
N ka tene mas tenpu
labilabi na tenpu
konbersu sabi
ladron di tenpu
txiga tenpu d’azagua!
//
Dipos d’azagua
Dr. Azágua
na son d’agua
midju na bidon
na poial di tenpu
nu ta papia di tenpu
sen tenpu kaba
nos e mondon di tenpu!
//
Marsianu nha Ida padri Nikulau Ferera
(dentu Bersu Kabuverdianidadi, 20Junhu2008)

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Caleidoscópio





Ergo-me cedo para a azáfama do dia. Rápida ginástica, enquanto o conjunto Ferro Gaita comemora 12 anos de vida, a ver também se me aqueço para a jornada. Ouço a rádio e nenhum barco de refugiados deu hoje à Costa. São os lançados inversos. Só que nós damos as boas-vindas com maus tratos e racismo. Com falácias mascaradas de Direitos Humanos. A ver se agradamos aos nossos patrões. Eu também vi (e não gostei) da posição do Ministro da Cultura de Portugal – entrevista à RTP - de que Cabo Verde (e não o Brasil) teria o grande papel de expandir a língua portuguesa. O Brasil (deixemo-nos de tretas) tem o maior e o melhor factor da lusofonia. Em quase tudo. Ademais, quando a esmola é muita, o pobre sempre desconfia. Há dias, dois miúdos estavam a discutir a importância de 5 de Julho e de 13 de Janeiro. Obviamente que não entrei na porfia, tão bizantinos eram seus argumentos. Quis declamar-lhes uns versos do meu falecido amigo Fernando Assis Pacheco. No “Último Tesão”, às tantas, o poeta sentenciava: “O país mete dó// guarda o último tesão/ para mandares/ meia dúzia de canalhas à tábua”. Os miúdos, filhotes de uma grande indigestão, começam ali a mandar vir. Ricos e pobres do Brasil, de Portugal, de Cabo Verde e do Mundo, roguem pelo discurso mais contrito dos vossos deuses. Não sabeis que, nesta fétida cloaca, o silêncio é de ouro? Vi o show de Isa Pereira que amei pelo “bom gosto”. Ouvi o álbum de Hernani Almeida e rendi-me ao instrumental cabo-verdiano. O álbum de Princesito está cinco estrelas e as fotografias de Kizó Oliveira têm arte. E, sem alarde, saio pelos textos para tomar ar fresco. Dos blogs, naturalmente. Ó rapazinho, ou estás quieto ou a gente te mostra o que é irreverência! Irrequieto, era João Bentes com os seus versos: “Democratos cabeçudos/ fodam-se na urna/ atem-se à bandeira/ enforquem-se nela/ lambam tudo o que conseguirem/ chupem chupem chupem/ engulam até arrebentar/ e no fim peçam a reforma/ como cidadãos da boa raça.” Ou Caetano Veloso, uma vez, farto dos miúdos revolucionários a patrulharem sua música, disse-lhes: “Quereis matar amanhã o velhote que eu matei ontem”, no que os fedelhos se entreolharam e se quedaram, quietinhos, a ouvir “Tigressa”, melodia melhor que certas causas da azáfama do dia…

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Sem Cinema

Charlie Chaplin e Albert Einstein durante a estreia do filme «Luzes da Cidade» de Chaplin em 1931




Estado da Nação


O director do jornal A Nação quis que eu escrevesse algo sobre o Estado da Nação. Cronista soooooofre! Ainda fiz um exercício para ver o que está bem e o que está mal nestas Ilhas Afortunadas, mas acabei por concluir que não estou inspirado para tanto. Aliás, faltam-me engenho e arte, bem como esse apanágio que se espera dos políticos. Para mim, a Nação está de boa saúde, mas precisava de melhor score em termos de qualidade de vida e bem-estar social. Um Ambiente mais cuidado. Uma Cultura, digamos, mais solta e fluida no mundo. O grande mercado é o mundo e há que ser competitivo para o mercado global. Basta de sermos transformacionais. A travessia acabou. Não sei se isto entra na pauta, mas não vale mais continuarmos a Nação do Estado. Deixo o busílis da questão para quem de direito. Evada-se quem puder…


Feira de Artesanato


Passo pela Biblioteca Nacional para assistir à 12ª Feira de Artesanato, organizada pela Associação Zé Moniz (AZM). É das coisas boas que se fazem por cá. Soube que, este ano, mau grado as dificuldades financeiras, 85 mesas de trabalho foram expostas. Eis uma iniciativa que importa apoiar e promover pelos governantes, pela classe empresarial e pela sociedade civil. Pelo Estado da Nação, ora. Dar vez e voz aos artesãos cabo-verdianos. Cultura, turismo, associativismo e empreendedorismo, tudo…de mãos dadas. Sugestão: afiliar a Feira de Artesanato da AZM ao Slow Food, uma associação internacional que articula o prazer e a alimentação com consciência e responsabilidade, reconhecendo as fortes conexões entre a comida, o ambiente, a cultura e o planeta…


Eugénio Tavares


Das figuras cabo-verdianas, duas suscitam-me interesse especial: Amílcar Cabral e Eugénio Tavares. Contrariamente ao Fundador da Nacionalidade, muitos não sabem sequer do mistério em torno de Eugénio Tavares, figura maior da cultura cabo-verdiana. Em verdade, o homem não nascera nestas ilhas, mas sim em Espanha, mais precisamente na Galícia. Para alguma gente, o bebé galego fora resgatada no mar, na sequência de um naufrágio ao largo da Ilha da Brava. O navio malogrado seria Guadalupe IV, que seguia da Espanha para a Argentina e o Uruguai. Mistérios por desvendar, se não enigmas por decifrar, creio que Cabo Verde precisa saber mais a fundo sobre o seu poeta, prosador, compositor e polemista Eugénio Tavares, além de Patrono da Cultura Cabo-verdiana. Alinhem-se também nesta viagem…


Cinema na minha cidade


De repente, a minha cidade não tem cinema. Naturalmente que a moda agora é televisão e DVD. Mas não faz sentido ver Senhor dos Anéis em casa. Ficará a faltar o escuro colectivo, a imagem em ecrã gigante e o som condicionado. Cinema é outra coisa. Cinema Paradiso. Cidade sem cinema é igreja sem campanário, fica aquém da expectativa. Na minha adolescência, se calhar com metade da população, tínhamos dois cinemas a funcionar: o Cine Teatro Municipal e o Cinema do Bairro Kwame Nkrumah (hoje, Craveiro Lopes), mais conhecido por Sibéria. Era época também do Cine Clube da Praia: A Confissão, O Cidadão Kane, O Couraçado Potenkine, Luzes da Cidade; Marcelo Mastroianni exalando-se nos filmes de Frederico Fellini, Brigite Bardot e Sophia Loren, para além de talento, mostravam que Deus criara a mulher. Por favor, cinema, CINEMA, na minha cidade…


sexta-feira, 18 de julho de 2008

Breve Programa Para Uma Iniciação Ao Canto




“Escrevo como vivo, como amo, destruindo-me. Suicido-me nas palavras. Violento-me”
Ruy Belo

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Julho a meio


Leituras

Dos que tive de ler, só consigo reler “Chuva Braba”, de Manuel Lopes. Depois que um oftalmologista e um oculista (ambos de Lisboa) me obrigaram a óculos, fiquei mais limitado. Mais selectivo também. Poemas, quero-os declamados. Mesmo assim os de Arménio Vieira e João Vário. JLT é também um grande inquieto. VV, JCF e MF têm versos conseguidos. Poeta era João Cabral de Melo Neto. Sim, estou maluco, mas ainda não tenho o veredicto da vilania psiquiátrica. Eu não consigo gostar de José Saramago, por exemplo. Adorei Memorial do Convento e, não consegui ver rasgo de arte e de inteligência noutra escrita desse Nobel. Prefiro Lobo Antunes, deplorando nele sua indexada existência a Saramago. Ou, então, Ruben Fonseca, Gabriel Garcia Marquez e Fernando Pessoa. Misturo tudo e todos, ó Zé Cunha. Em verdade, prefiro mil vezes comer pão saloio com morcela, se o tinto é de boa reserva e se a companhia desafia as leis de Éden. Refiro-me ao Jardim de, naturalmente…

As razões do George W.

Lembram-se de Nené Prancha, para quem penalty futebolístio era uma pena tão gravosa que deveria ser batida pelo Presidente da República? Pranchinha era um abusado da primeira água. Quando partiam as tropas americanas para a invasão do Iraque, ele dedicou uns versos (felizmente maus) a um jovem cabo-verdiano que, incauto e alienado, acreditava ainda nas razões do George W. Prancinha mandava farpas nestes termos: “Escuridão e silêncio/ deserto, zoon que nunca mais acaba/ tu, que já viste Madonna em Times Square/ e que pensas o mundo como um grande videogame/ nessa infinda guerra petrolífera, grande sacana/ mais um pé em falso e estás fodido”…

Regressistas

Creio ter sido de José Mário Branco a frase “e se inventássemos partir para regressar”. Hei-de perguntar isso ao João Branco que, para além de fazer teatro e declamar versos, tem o Blog Café Margoso. Entrementes, estarei certo ter sido Eugénio Tavares, esse galego que chegou a Cabo Verde no naufrágio do navio Guadalupe IV, a sentença: “si ka badu, ka ta biradu”.

Banho de lua

Parto do princípio que a lua não anda apenas atrás de Mano Preto e dos Raiz di Polon. Deve também seguir o rastro de Princesito, com Spiga, e de Mário Lúcio, com Badyo, caramba. É bem possível que, branca e cheia, siga ainda Hernani Almeida, em Afronamim, e que, minguante e, sobretudo, prateada, ande pela sombra de Isa Pereira. Vejam, meus amigos, esse luar sobre o dueto de Teté Alhinho e Sara Alhinho! Mãe e filha. A lua tem cada uma…

Frases dos outros (de Julho a meio)

Não volta haver amor como o primeiro. Ah, kanadja…
Amor é no devagarinho. Lebi na petu. Bedjiça...
O aeroporto na Praia ainda não é o Aeroporto da Praia…
A literatura pessoana é a melhor literatura da lusofonia. É só conferir…
Pior de Pessoa: Tudo vale a pena. Blá, blá, blá…
A cultura fez mais do que qualquer governo. Por isso, esta cepa torta…

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Some rest

Some rest

Quando estou cansado – de trabalho, pois nesta casa trabalha-se -, leio um livro, ando à beira-mar ou preparo um prato. Todos os meus amigos (e os meus inimigos também) sabem que adoro cozinhar. Aliás, há coisas que me dão muito prazer: viajar, escrever e cozinhar. E cuidar das crianças – ensinar, dialogar e brincar com elas. Passar horas esquecidas com os jovens igualmente. Quando estou cansado, ouço música, boa música, diga-se de passagem. Estiro-me na cama e passo em revista Mozart, Jobim e Davis. Folheio um livro de mesa e aprendo um pouco mais sobre as artes plásticas. Miró, por exemplo, acompanhem-no. Cansados ou não. Vou à cozinha (close-up na foto, pleaaaaaaaase) e preparo um bife de atum à minha moda. A que se guarnece com muito coentro, alho à descrição, tomatinhos e rosmaninhos. Saad Kacem, meu confrade de Koutubia, provou-o e disse que era…um poema!

Play Station, ^&*#@*& e etc

Muitas vezes, neste Blog, encontras-me outro. Será? Deve ser da quarta-feira. Reconheces-me pelo toutiço. Continuo bochechudo. I don’t care. De repente, aparece-me um homem maluco de espada na mão e corre atrás de mim pelos bairros castiços de Casablanca. Parece até um filme americano, desses maus, com muita correria e actores medíocres, alguns prováveis Governadores da Califórnia. Mas nesse sonho (ou seria pesadelo?) eu corro, tantas eram as plantas do Parcours, outras tantas eram as alamedas de um lugar parecido a Providence, R.I.. Roger Williams Park, onde morei por algum tempo. Vejo um polícia e ^&*#@*&, raios e coriscos. Dou de caras com um gangster e *&^%$#, chicra. Salto uma ribanceira e, num tapete voador, sobrevoo Nova Iorque (Oh, Sara, olha o Finfas aqui, ó!), ainda com as torres gémeas. Muitas vezes, estou outro. Tipo caricatura de Obama & Patroa em The New Yorker, a revista menos FDP da Grande Maçã. Não sei se sonho ou se, por lapso, entro no jogo do Play Station…deve ser desse tecno-funk que não ajuda!

Last call

Ainda não foi desta. Direi que o amanhecer aconteceu sem neblina. E a faca de cortar o pulso estava cega, mouca e imprestável. Fosse uma morte despretensiosa, apenas minimamente mediática. Uma morte de fim-de-semana, sem pachorra. Mas o suicídio – o acto em si, diga-se -, esse teria de ser com pompa e circunstância. Com frisson. Já leram “A Faca”, de Jorge Luís Borges? A faca tem função existencial. Sem dialéctica’, nem semântica que se lhe notem. Por ora, o Albatrozberdiano – não pela “súplica” da Sara, minha amiga, nem pelo “conselho” do Djinho, sempre atento, mas pelo medo do Além e do Aquém – continuará entre os vivos, aguardando, como os ratos, os percevejos, as pulguinhas e os porcos mais iguais que os outros animais, a sua Última Morada. Ou tão simplesmente a prometida manhã de neblina…

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Ich Ruhmer

Não poucas vezes, aliás muitas vezes, tomo a decisão de acabar com o Albatrozberdiano. Invade-me a dúvida sobre o porquê e o para quê destas postagens. Questiono-me sobre a escrita blogueira, seus ganhos e suas perdas. Acto demiurgo ou quase divino? Alguma enigmática procedência? Ou a mesmíssima chiça de estarmos a pastar entre porcos triunfantes? Questiono a existência de Deus, do demónio e do domínio. Diante da relojoaria existencial, as nossas horas estarão marcadas? Quem é o genitor desta merda? Se calhar, estou doido varrido e o pessoal ainda não sabe. Arre que já somos tantos no sadomasoquismo da Blogsfera. Pura afasia. Qualquer dia (terá de ser numa manhã de neblina), corto o pulso ao Albatrozberdiano e deixo sangrar este Blog. Para que tenha uma morte exangue e lívida. Sem eternidade...

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Rade

Plúmbeo céu
Cinza e cor de lago
Dos teus olhos…

Espelho que reflecte
Senão a luz negra das horas
As brancas sombras dos lugares…

Cisnes e gansos
O vaivém dos barcos nas hordas
Estátua magenta - sejas tu…

terça-feira, 8 de julho de 2008

Do Sol à Soraia + Badio ka manso em tempo de caça às bruxas


Acomys cahirinus


Sol fulgurante



Um sol fulgurante diz que la vie est belle e que tudo - do infinitamente pequeno ao grande -, vale a pena. Atravesso uma fase líquida (não me refiro ao álcool, bem entendido), como Picasso antes de desaguar em Guernica e naqueles touros retorcidos. Nessa noite chuvosa, fomos (os três) a um restaurante cubano. Ouvíamos Célia Cruz a cantar Obladi Oblada, mas eu queria sussurrar-vos os versos de Baudelaire. Paranóias de se estar em Paris, suponho. Acreditem-me: sou mesmo um devoto de Hefesto. A paz, mesmo a de Cristo, é o que há de mais essencial na vida. Estou a só no meu quarto. Na Cidade da Praia, Julho de 2008. Leio Kamiquase, de Paulo Leminsky, logo existo…



Badio ka mansu



A história do rato, descrita no Blog Ala Marginal, de Abraão Vicente, me fez rir muito. Fiquei a imaginar o meu amigo, com ares de galgo e de sapateador, mais aquele quê de galo molhado, de pau em riste e óculos vermelhos, a vasculhar os cantos do cubículo e a ver se acabava de vez com o roedor. É que tudo poderia terminar sem violência, se a Estrela do Programa 180º fosse como o Marido de Carla B. e desse à maçada de “comprar os bons ofícios” dos revolucionários colombianos na libertação de Ingrid Bettencourt. Diplomacia & 2 milhões de euros, que gente fina é outra coisa. Mas Abraão, não: vassourada, pistola, foguetão, como naquele funaná, e o infeliz, apanhado no veio da maldade, morreu como nasceu: rato crioulo…porra!



Tais defeitos



Alguém me telefona (aflito e em estapafúrdio) que começou a “caça às bruxas”. Estava-se à espera de quê? Quem se surpreende hoje com os esquentamentos, em tempos de camisinha e de Viagra? Só os mal-intencionados. E os mal estacionados. Chamem o Mata-ratos, para vir à vossa defesa. Ou então, aquele chato (que nem aquele dos pelos púbicos), do sindicato, naturalmente, para declarar greve geral contra os novos deuses. Nesta cloaca acontece cada uma! Há sempre uma pirueta, aquém de valente, além de bizarra, para instalar polvorosa nesta cidade. Dos ditadores, Nero era medalha de ouro de assaz algazarra. Queimou Roma e escreveu maus versos. Petronius, filósofo de fina pena e criador da sátira, imortalizou tais feitos…



Big Mac



Eu conhecia a Soraia de outros carnavais: morena, olhos esverdeados, violão em forma de mulher. Agora, ela está paquidérmica. Uma tia do Harlem, que é o bairro mais terceiro-mundista de Nova Iorque. Aquela não era a Soraia dos meus tempos. Vítima da alimentação consumista, rápida e industrializada, vê-se que ela não aguentou aos ataques cerrados dos McDonald’s, Burger King, Kentucky Fried Chicken e Pizza Hut. Diante desse feio: Abaixo a gordura! Abaixo a fritura! Abaixo o Fast Food! O Sistema é de facto uma grande fraude…

Eu

eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora

quem está por fora
não segura
um olhar que demora

de dentro de meu centro
este poema me olha


Paulo Leminsky

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Proibido fumar


Neste Blog é proibido fumar

Preferimos não proibir coisas saudáveis – música clássica, tartarugas marinhas e alimentos orgânicos. Também é livre amar neste Blog. Fazer poesia também pode. Você pode contar as Mil e Uma Noites neste Blog. Mas não abrimos mão à proibição do tabagismo. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), existem hoje no mundo cerca de 1,1 bilhão de fumantes. Desse total, 800 milhões estão nos países em desenvolvimento, em torno de 73%. Morrem a cada ano mais pessoas vítimas do consumo de cigarros que a soma das mortes devido ao SIDA, violência, acidentes de trânsito, incêndios e suicídios. Por conseguinte, os fumantes estão impedidos de navegar neste Blog…

Tráfico de droga também não

Nós aplaudimos toda a vez que os correios da droga são apanhados nos nossos aeroportos. Apenas lamentamos que muitos barões ainda permaneçam à solta a consumir connosco o oxigénio rarefeito. Neste Blog, o “pessoal do movimento” também não pode circular. Somos atenta e abertamente contra a prática do tráfico. Já os toxicodependentes podem ler as nossas postagens. Servir-lhes-á de emenda e de exemplo. O flagelo da droga só é comparável ao flagelo da guerra. Por isso, aqueles que fazem guerra são inimigos declarados do Albatrozberdiano. Ao vilão, vara na mão…

Gostar de Paris está liberado

Chover pode. Mas alagar não pode. Chover no molhado tão pouco. Dançar pode e namorar também. Gostar de Paris está liberado. The Sole of Africa, Raiz di Polon, Mindelact, Pantera, Tcheka e Mayra…embarque nessa viagem linda. La Strada...pooooooooode sim! A indiferença por Darfur está proibida. Bombardear Bagdad pode destruir o Jardim de Éden, portanto não pode neste Blog. Tratar mal os refugiados e deportá-los como gado, você acha que pode? O Aquecimento Global é outro flagelo e, está visto, capitalismo selvagem também não pode. Você pode (e deve) ouvir “Namoro sem amasso, sou eu assim sem você”, com Adriana Calcanhoto. Não fume nunca, meu bem. Mas Partimpim é tudo que você pode…

A Caminho de Viseu *

Indo eu, indo eu
A caminho de Viseu
- Cantiga de roda (da minha infância)


Revisitando a crónica

A crónica estava tímida, quase não querendo contar nada do que sabe. Cheia de álibi, ela armava-se em neutra e isenta, diria mesmo, coisas de quem anda por cima do muro. Robert Mugabe arma uma grande fraude, a crónica fica pelo princípio da não ingerência. De resto, a fraude virou uma pandemia. O preço do petróleo caminha para os 200 dólares, a crise do capitalismo é cíclica e tudo voltará ao normal. E há escassez de arroz no mercado, a crónica já gosta de batatas e de massas. Sempre nesse chove não molha, sobretudo a cuidado de não molhar o cronista, o texto ficaria parvo, romântico e inócuo. Texto pelo texto. A falar das flores e da lua a derramar sua prata. Mas assim não fazia sentido. Mil vezes a afronta de se alinhar pelas causas. Mais vale o risco de acreditar que um outro mundo é possível. De longe esta outra atitude de atirar pedras no charco da nossa pasmaceira que fede…

A “concorrência”

Assim como há crónicas inconsequentes, há cronistas chatos e recorrentes. Escrevem por encomenda e servem-se de arma de arremesso. Entre Deus e César, posicionam-se em quem dá mais. Há quem chame isso de pragmatismo. O Pranchinha, que a morte lhe dê merecido descanso, não guardava respeito a esses fariseus. Não que esteja a falar da “concorrência”, pois nem sempre o pessoal (lá por estar na IDC, Opus Dei ou raios que os partam) traz os mínimos olímpicos, em termos de engenho e arte, para vir à tertúlia consequente. Falo tão simplesmente daqueles que, sem rei nem roque, aviltam o bom-nome de Frei Betto, Al Gore, Jean Ziegler e Nelson Mandela. E desdenham das causas como o Aquecimento Global, a Greenpeace, o Fórum Social Mundial, o Slow Food e a Teologia da Libertação. E, como nada é por acaso e inocente nesta vida, refiro-me a esses…naturalmente!

*De Lisboa a Braga, a comboio, ficaria na estação de Viseu. Provavelmente, por causa de uma cantiga de roda (da minha infância). Inconsequente? Nem tanto…

domingo, 6 de julho de 2008

Aos 33

Não venho aqui paparicar o ego dos rincões e dos cutelos. Nem venho pedir favores aos deuses da terra. Tão pouco faço vénias às espertezas de ponta de praia. Oficializar a língua materna e primeira é tornar de jure o que é de facto. Em Cabo Verde, quem chora ou faz amor noutra língua, atire a primeira pedra. Quem sonha e compõe melodias noutra língua, que não em crioulo, alinhe-se deste lado da bicha, que é hora, mais que hora, de sentirmos o pulso dessa esmagadora maioria. E não vale a pena tantos decretos, seminários, tertúlias e outras dissimulações. Para já, a Constituição Nacional consagra o bilinguismo. A par disso, precisamos dominar bem as nossas duas línguas – a cabo-verdiana e a portuguesa, numa coabitação definida e organizada. De resto, não faz sentido que as nossas crianças sejam alfabetizadas em “segunda língua”, que não seja instituída no currículo do ensino secundário a aprendizagem da escrita em crioulo e que o ensino superior não considere a cátedra da língua e da cultura cabo-verdianas. É agendar a dita no Parlamento, construir o necessário consenso para alterar a Constituição e oficializar "a partir desta data histórica" o Crioulo de Cabo Verde. A tal coragem que, outrora, teve Dom Diniz com a língua portuguesa, que, me perdoem os mais afoitos e os mais aficionados, tem as suas esquisitices (tipo "fi-lo porque qui-lo") e deixam, quando soe, qualquer um no prejuízo. Ademais, se houve consenso político para a aberrante lei eleitoral, creio que não faltará boa vontade para a oficialização do crioulo. Assumamos, pois, o bilinguismo de Cabo Verde!

sábado, 5 de julho de 2008

KANTIKU ANUAL KABUVERDIANU

(inspiradu na puema MAMÁ-TXUBA, di Dr. Azágua)

Pueta dja kanta
diskansadu i xintidu
ta ngoda Mama-Txuba
ku bokadu nos melodia
pingu nos konpasu
mantenha pa El fla-nu
nen si e uas ta bai
otu banda di Atlantiku
//
Sin, Mama-Txuba
es korpu di morena
na Atlantiku plantadu
xeiu di kalor nostaljiku
di dizeju ardenti
ta konvulsa na orizonti
sima mar revoltadu
tudu meiu dia en pinu
di sol ragatxadu
sen do nen piedadi
di ses entranha ta suga
tudu sangi di vida
- agu di karisias pasadu
//
Pueta kantador
Deus ta kre
Mama-Txuba ta obi
bu presi ritimadu
kadensia konbersu sabi
pa El ben beija
es korpu di morena
na Atlantiku detadu
ta spera Se karisia
//
Mama-Txuba odja
spraiadu na Atlantiku
es korpu di morena
di beleza sen par
mas raskoa ta bira
bistidu di verdi
verdi di speransa
trokadu Bus karisia
inda ki fugazis
//
Mama-Txuba
di mon pa seu
lugar di Bu morada
N ta pidi-Bu
kudi Dr. Azágua
sukuta kanson di pueta
kantiku anual kabuverdianu
//
Marsianu nha Ida padri Nikulau Ferera

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Urbaníssimo


Praia, meu berço

Gosto da cidade grande, cosmopolita e frenética. Gosto de estar na cidade como se estivesse no Ode Triunfal, de Alvaro de Campos. Quando dei de caras com Nova Iorque, chorei. São Paulo foi amor de perdição. E Paris sussurra pelos meus poros. Agora, à boca pequena (para que os FDP não me ouçam), acho que sou londrino. Jack, the Stripper, entre a neblina de Netting Hill. Gosto, mesmo quando a cidade não se extrapola em metrópole – seja Lisboa, Boston, Casablanca, Belo Horizonte ou Genebra -, de ficar pelos encantos que vou descobrindo – amigos novos, deuses disfarçados de mulheres, cães que falam com crianças nos jardins e rosas com o seu lado de cá. Em Dakar, estive para acreditar em Deus. No Rio de Janeiro, o Belo embriagou-me e estou de ressaca. Parei um dia em Joanesburgo e apaixonei-me por Nelson Mandela. Passo pelas cidades de Cabo Verde, todas pequenas, mas com os seus encantos, e, me perdoem os que não se libertam dos seus cutelos, sou urbano. Urbaníssimo. Praia, meu berço, meu umbigo…

Sem muita metáfora

O FMI admite estar impressionado com a dinâmica da economia de Cabo Verde, mas Nha Filó (amizade recente), essa não vai muito na cantiga do sucesso económico. Em verdade, o macro encanta aos outros (FMI, Banco Mundial e companhia), mas o micro (arroz, feijão, peixe, carne, leite, material escolar, gás de cozinha, luz e água, o micro dizia) não encanta aos da Tapadinha mesmo nada. Sem dar muita bola à ambivalência do macro e do micro, Nha Filó é daquelas que precisa do imperioso para colocar na panela. Três por dia, remata a minha amiga, sem muita metáfora…

Autocarro #20

Neste momento, já não estou Esperando Godot, mas aguardo Um Bonde Chamado Desejo. Com a chegada de Denzel, 16 anos, e com o Pablo, 5 anos, por perto, a minha vida ganha mais luz & água. Os filhos são o nosso desassossego, ora! Aquecimento global, crise dos combustíveis e escassez de alimentos, que mundo para os meus filhos? A chuva a falar mantenha, mas o paludismo que espreita, o deputado a falar asneiras no Parlamento e as "soluções" para enganar outro, e os meus filhos nisso tudo! Queria dar aos meus filhos poesia, muita poesia, a poesia que falta nestes dias. Falta-me algo mais, pois existencialmente falta-nos sempre algo mais. A poesia concreta de estarmos todos juntos perante a promessa de um mundo melhor, afinal possível. Queria estar com eles no Autocarro # 20

terça-feira, 1 de julho de 2008

Decifrar a pedra



Nem sempre me é fácil decifrar
Toda a fruta que, em teus lábios,
Sabe tão-só a beijos e carícias
Quão amiúde a poemas por dizer…

Nem sempre posso, do teu olhar,
Mirar o voo que nele se deseja
- Entre magenta, azul e violeta -,
E dele acalentam as cores furtivas …

Pôr as mãos sem tocar ao rente
Que são pêlos de ti e do infinito
E sem roçar, seja de leve, a lua…

Sorver os sais, o suco das flores,
Os vinhos de nada, os halos de pão
E é pedra o que, de segredo, madruga…