sexta-feira, 28 de abril de 2006

Sanfilipe – entre o grito e o silêncio

"O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons."
(Martin Luther King)



Conhecendo, por dentro, a política e o programa culturais do Governo, vejo, com regozijo, que as manifestações em prol do património ocorridas em São Filipe vão em sintonia pensamento estratégico preconizado. O importante, ao fim e ao cabo, são as questões de fundo.

Uma das maiores preocupações, constituindo mesmo uma questão de fundo, do Governo é a salvaguarda e a promoção dos valores materiais e imateriais da Cultura e da História de Cabo Verde. Para tanto, as instituições estão criadas e vocacionadas. E, valha-nos a democracia, o debate está aberto, já que nestas coisas, aqui ou na China, o crescimento briga muitas vezes com o património instituído. O que importa realmente é a noção da cidadania e da realidade.

Obviamente que o IIPC encara com atenção e parcimónia o “tesouro urbanístico”, que é São Filipe. Mas entre encarar e agir, mercê dos meios e recursos existentes, às vezes há uma demora crítica, se não mesmo um hiato. Igualmente, sabe-se que a própria Câmara Municipal tem os seus planos de restauro e de protecção do património construído ali existente. Uma vez mais, entre as intenções, os planos e as materializações vai uma distância exasperante. E o cidadão deve estar atento a tudo isso. A cidadania tem a ver com a autonomia cultural e a autonomia da acção cívica.

Et pour cause, a carta-aberta de Fausto Rosário – não a forma em si, mas a sua essência – tem toda a razão de ser. Outros “Faustos” deveriam ter levantado as mesmas preocupações na cidade da Praia, na Cidade de Santiago, na Vila de Ribeira Grande, na cidade do Mindelo, na Vila de Ribeira Brava e noutras paragens. É preciso quebrar “o silêncio dos bons”. Outrossim, o protesto de três cidadãos acorrentados defronte aos Paços do Concelho não deixa de ser curioso e paradigmático. A cultura também se faz pela indignação. O diálogo entre as posições antagónicas é quase sempre muito profícuo. Não há que ameaçar com tribunais, nem com retaliações. Valha-nos a democracia e a tolerância, repito. Importa dar respostas. As inumaráveis respostas. Dialogar com causa e consequência. Isto é, modernizar a cidade, sem matar os seus traços patrimoniais e idiossincráticos. Depois, há que repensar a “modernidade” e resignificar a “qualidade de vida”.

A Bila, patrimonial e histórica, monumental como poucos espaços em Cabo Verde, tem de ser tombada, restaurada e reanimada. Por uma cadeia complexa e estrategicamente articulada – Governo, edilidade, munícipes, cidadãos cabo-verdianos e não só. Não apenas para o gáudio dos seus moradores, mas também e acima de tudo (como preconiza aliás o Programa do Governo) por respeito à memória colectiva de todos os cabo-verdianos…



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