quinta-feira, 27 de abril de 2006

A Praia, os tristes do pedaço e a hora cidadã

A cidade da Praia, por ser a capital de Cabo Verde, país insular e nação diasporizada, é a alter urbis de todos os cabo-verdianos. Nela, os cabo-verdianos, em consenso e plataforma, deveriam consolidar a memória e projectar o futuro. Com estas palavras, à guisa de desejo, queria saudar o fórum sobre a “Identificação de Vocações, Medidas de Política, Infra-estruturas e Atitudes para o Desenvolvimento da Praia”, em boa hora organizada pela Associação para o Desenvolvimento da Praia (Pró Praia).

A Pró Praia considera (com toda a legitimidade) que, antes que a cidade atinja 150, daqui a dois anos, “é importante que algo seja feito para a mudança do satus quo da capital do País”. Em verdade, é hora de tematizar a Praia e que ninguém se engane, pois esta cidade resulta de processos sociais, culturais, económicos e políticos complexos. O debate terá de ser também complexo e com perspectivas multidimensionais. Discorrer sobre “Urbanização e Segurança – Impactos, Causas, Consequências e Perspectivas” nos obriga a todos a uma análise retrospectiva, conjuntural e prospectiva, para que encontremos as alternativas sustentáveis. Mister é a mudança e a palavra de ordem deve ser a sustentabilidade…

As ruelas de Ponta Belém, as casas térreas e os sobrados das ruas e travessas, o mercado municipal, os canhões do Cruzeiro, a praça Alexandre Albuquerque e a sua gurita, assim como toda a Várzea da Companhia e a Achada de Monteagarro, são uma parte importante da nossa alma e da nossa identidade, factores, quais impressões digitais, da nossa singularidade, mas temos a convicção que são atributos insuficientes para assegurar a nossa competitividade presente e futura.

A hora é de pensar a Praia como “praça financeira” e como referência cultural, a “last frontier” do desenvolvimento sustentável. Uma Praia com artes, monumentos, museus e bibliotecas. E com os investimentos chineses, portugueses, angolanos e ingleses, já apontados, todos benvindos e necessários. E venham outros, porque a vida nasceu

Uma cidade como a Praia terá de reinvestir pesado em equipamentos e serviços, como aeroporto, porto, universidade e parque industrial, ao tempo que recoloca na agenda política e no debate social a questão dos custos da capitalidade. Em verdade, só há desenvolvimento quando cruzarmos cidadãos educados em espaços equipados. O resto são histórias (bairrismos, mesquinharias, colonialismos internos, interiores e mentais, e quejandos)…e quanto a isso, de há muito que já estamos acordados, atentos e acesos.

Os tristes do pedaço querem, no entanto, uma Praia retrógada, coitada e tacanha. Bem entendemos o móbil de tal gente. As intenções, mais “piedosas” do que ecológicas e/ou patrimoniais, devem ser entendidas na sua exacta dimensão. Elas têm os seus próprios e acantonados registos. Mas nós, os amantes desta cidade, queremo-la metrópole moderna e arrojada, competitiva com as demais capitais, e para tanto precisamos neste fórum de uma visão de futuro, de uma utopia aglutinadora e, seguramente, de uma estratégia de afirmação.

A insegurança na cidade da Praia (a violência urbana, a tóxicodependência, a condução ofensiva, etc) não é causa, mas consequência, de um abandono e de um laxismo, a vários níveis e de muito, muitíssimo, tempo. Reduzir o debate ao lixo e aos assaltos é empobrecer o convívio democrático. Os cidadãos têm de “pegar nesta cidade”, alter urbis de todos os cabo-verdianos. A pólis é feita de cidadãos (que votam e pagam impostos) e são estes a sua componente mais importante, afinal.

Um abraço apertado e fechado, como o anel rodoviário ora em construção, a todos os amantes da Praia.

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