No começo, achei estranho. Levar a cebeça a um aprendiz? Cabeça e pescoço, já que o propósito era cabelo e barba. E ele ali: jeito de aprendiz mesmo e um nadinha amaricado para o meu gosto (e Seu Aufredô, o barbeiro propriamente dito, tratava-o por bóia fria) . A vantagem é que era metade do preço e a carecada era de uma assentada. Em Cabo Verde, a barbearia era um ritual facilitado: primeiro máquina a zero e depois lâmina. O meu barbeiro já sabia do meu gosto: corte tudo que seja cabelo, menos sobrancelhas e pestanas. A desvantagem era a faladeira sobre o futebol e a política. E o aprendiz pergunta: com ou sem assalto? E eu, sem perceber, ao que ele corrige: as barbearias são assaltadas em Cabo Verde? E eu: creio que não, comigo nunca aconteceu. Aqui, umas cinco vez, quatro à mão armada. E explico: primeiro, tesoura, depois, máquina, e, finalmente, faca. Não, sempre com revólver, companheiro, disse o aprendiz de barbeiro. Conversa nesse tom, de cabo a rabo, lá acabei rapadinho e fresco como um leitão à hora do forno. Você ficou um gato e não foi assaltado, repetiu o aprendiz, para se recompor diante do meu olhar de censura. No que apareceu o dono da loja, o barbeiro propriamente dito: e aí, africano, tu curtiu o corte aqui do bóia fria? E eu, numa fina cumplicidade, aquiesci-me: nota dez, senhor, melhor do que na terra. Sem política, nem futebol…
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