terça-feira, 6 de janeiro de 2009

2009: e se o Ambrósio chegasse

Na primeira crónica do ano, queria estar optimista e esperançoso. Embevecido quanto ao futuro. Crente de um Deus que não protege as crianças de Gaza. E zangado com os demónios que não levam de vez Mugabe e os ditadores afins. Queria estar, meio idiota, a achar que este País será um tigre asiático. Suiça da África. Ou a potência dos Rios da Guiné, onde, outrora, como “lançados”, traficávamos escravos e, ora, olhamos de soslaio, com olhos de “parceiro estratégico”, diga-se, os desgraçados da Costa. Na crónica a abrir 2009, queria estar positivo, uma soma algébrica de patriotismo, olhando-nos, de Santo Antão à Brava, passando pelos sampadjudos & badios e roçando pelas lojas chinesas. Talvez aprenda o Hino este ano e consiga ficar hirto e sisudo, em sentido de Estado, na fífia e no flato de uma orquestra que maltrata o incandescido verso. Talvez corra atrás do Carnaval, da tabanka, dos comícios e dos festivais, bem como doutras enchentes, que esta sociedade caudalosa concede. Talvez eu fique à margem de tudo, no miradouro onde o oceano se perde, e navegue com estas ilhas para o Sul. Queria estar acordado para quando chegasse…o Ambrósio.

Constituição da República & não só

A pauta queria que eu escrevesse sobre a Constituição da República, mas retive o rosto contorcido de uma criança em Gaza City e, por mais que tente, não consigo desviar os olhos dessa cena. Uma criança no leito do hospital, ali no Late Edition, da CNN. Outra tragédia trespassa os meus dias. A mulher, de 28 anos, morre de Sida e o marido, também de 28 anos, se suicida. O casal deixa duas crianças à mercê da solidariedade que, felizmente, se faz pronta e pragmática. Naturalmente que eu gostaria de ver a Constituição da República revista. É um desejo que guardo desde 1992, quando a mesma fora aprovada. Ela vinha, embora moderna (ou recente, como corrigira um grande amigo), com os seus desacertos à partida, alguns que se provaram de lesa governabilidade. Respeitámo-la, entretanto. Como se respeita um Hino ou uma Bandeira, de que não se morre de amores. Revisemo-la e toquemos o barco para a frente que “navegar é preciso”. Em verdade, o que me toca a alma são os casos humanos. O rosto contorcido de uma criança em Gaza City…

Ano Novo

Como não tive a ventura de ir ao baile, não sei se a primeira madrugada do ano tenha sido de promessas. Entristecido com 2008, que foi de assaltos, violações & outros crimes, achei por bem ficar em casa. Não para cantar Feliz Ano Velho. Para esconjurá-lo. Para reler um conto de Ruben Fonseca, em que um gang de favelados invade a festa da classe média carioca e faz uma grande fuzilaria. Igualmente, fiquei horas a assistir, pela televisão, o “airstrike” dos israelitas contra o Hamas. Juro-vos que já não podia escutar aquelas músicas de Boas Festas e Recordai, mais chatas que as sessões de um templo maior que uma estação televisiva de duvidosa qualidade anda a nos presentear. Mas Ano, como família, não é para se escolher. É para cultivar. Esperando, aliás formulando votos, que seja melhor, muito melhor que o anterior. Deus tem…

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