quarta-feira, 24 de maio de 2006

Face ao Leviatã



Das coisas e das causas cabo-verdianas

Li, com gosto, entusiasmo e espírito aberto, o livro de David Hopffer Almada – “Pela Cultura e Pela Identidade: EM DEFESA DA CABOVERDIANIDADE” - e, acto contínuo, a respectiva recensão crítica de António Correia e Silva – “Defesa da cabo-verdianidade, segundo David Hopffer Almada”. A obra e a sua apreciação crítica, binómio que fundamenta qualquer ambiente científico, abordam questões candentes e prementes – todas de interesse nacional. A oficialização da língua cabo-verdiana, por exemplo, é desiderato a que Cabo Verde não se pode furtar. A adesão de Cabo Verde à União Europeia (e, quem sabe, a outras alianças) também é assunto quente, a merecer exaustivo debate. Além do valor dos dois trabalhos, importaria realçar que o acasalamento entre a acção e a reacção intelectual, coisa rara numa terra onde a tese só de raro suscita a antítese, deitando por terra a necessária dialéctica que faz rodar a História, se tornou mister e imperioso. Não só de bons autores e criadores precisamos. Os críticos que balaçam os paradigmas e fazem jus à razão hegeliana são por cá mais do que necessários…

A África e os Objectivos do Milénio

A escrever um texto para a palestra sobre a África e os Objectivos do Milénio, tema que me coube no evento que a Universidade Federal do Ceará organiza, dou comigo a pensar na força da História. Os ODM seriam alcançáveis, se houvesse um esforço crítico dos próprios africanos em relação ao apropriar do seu processo histórico. Não se trata apenas da independência, da democracia, do estado de direito e do empreendedorismo. Trata-se de emponderar o africano em face da sua História e seu destino. Trata-se do resgate da autoestima, de autoconfiança e da motivação para mudar o mundo. Devo à professora Margarida Fragoso, nos tempos do secundário, o gosto pela História da África. Ela levava-nos, em primeira mão, a História da África Negra, de Joseph Ki-Zorba. Falava-nos, com entusiasmo e admiração, do Egípto Antigo e do Império Núbio. Explicava-nos, sem óculos coloniais, a civilização dos Almorávidas, dos impérios do Gana, do Mali, do Gao, do Songai e dos Haussas. Aprendíamos, em beleza e propriedade, a grandeza dos Iourubás e do Benin. Naquelas aulas, sabíamos descer pelo território dos bantus e ancorar no reino do Congo, do Zimbabwe e do Monomotapa. Precisamos descolonizar não apenas a nossa economia, mas a nossa história, tanto a do Continente Africano como a dos afro-descendentes, a vasta Diáspora Africana. A história constitui assim, segundo Joseph Ki-Zerbo, a alavanca fundamental para a nossa tomada de consciência em relação ao nosso destino, visão comungada por grandes pensadores do W. Dubois, Nkrumah, Lumumba e Amilcar Cabral.

Discordando do meu amigo Casimiro

Das raras vezes em que tive o prazer de conversar com Casimiro de Pina, de quem sou amigo, guardei as melhores impressões. Arguto e culto, comentara com José Filomeno, promotor de tais encontros. Casimiro de Pina é um estudioso e um cavalheiro. Aprecio trocar ideias com ele, mesmo quando as nossas opiniões se divergem de molde irreconciliável. Prevalece entre nós o respeito mútuo, diga-se. Ambos somos apreciadores de Alexis de Tocqueville e de Max Weber, sobretudo no entendimento que ambos tiveram da Revolução Americana e da Ética fundadora da espiritualidade capitalista. Mas creio que não temos a mesma leitura crítica do mundo, mormente o “mundinho crioulo”. Pessoalmente, não me posiciono em trincheiras – desta banda os bons e os santos, doutra banda os maus e os demónios -, razão por que não me engajo nas capelas políticas. Sou S/Cem Margens face ao Leviatã, seja ele qual for. Et pour cause, os grevistas de fome (ou doutra estratégia, pois de estratégia se trata) não estão imunes ao crivo crítico da sociedade. Assim como tiveram apoiantes, têm tido acérrimos críticos, porque a nossa sociedade (e ainda bem) não se satisfaz com a unanimidade. Germano Almeida, pela natureza do homem e pela sua trajectória, jamais seria um intelectual orgânico. De nada. Ele é irreverente, homem! Casimiro de Pina precisaria participar dos encontros de sexta-feira, na Praia do Norte, em São Vicente. É longe. Mas o bom vinho (que Germano Almeida conhece, como poucos) justificaria o encontro…


3 comentários:

strawberryfairy disse...

Olá! fico contente que tenha gostado do que leu pelo mundo da fada dos moranguinhos... é bastante interessado como as coisas acontecem... sou licenciada em História tirei o curso em Coimbra e no fim do ano de estágio fiz um trabalho sobre o ensino da hist é angola e uma das minhas fontes foi Ki-zerbo:)
Na Fluc há uns anos atrás havia uma cadeira de história dos Palop's que também fiz... mas agora parece-m que a única coisa de que se fala relacionada com África é mesmo História da Expansão Portuguesa eh eh eh e mais não digo...
Cumprimentos e até breve
p.s continuarei a escrever sobre o T.O

Filinto Elisio disse...

Kâmia!

De facto é interessante. Sou licenciado em Biblioteconomia e mestrando em Administração de Empresas. Mas tenho um irmão, muito chegado, que é Historiador. E, para além da nova historiografia africana (Ki-Zerbo, Anta Diop e outros), somos todos "fissurados" pelo Teatro, razão por que fiquei curioso pelo T.O.
Ademais, a outra Kamya é uma amiga, reforçada também no mundo blogueiro. São as novas sociabilidades que o ciberespaço proporciona.
Se quiser contacto menos público e badalado, disponha do filintos@hmail.com .
Cumprimentos,

Filinto Elisio disse...

Seria filintos@
gmail.com