Não creias, Lídia que nenhum estio
Por nós perdido possa regressar
Oferecendo a flor que adiámos colher
Cada dia te é dado uma só vez
E no redondo circulo da noite
Não existe piedade
Para aquele que hesita.
Mais tarde será tarde e já é tarde
O tempo apaga tudo menos esse
Longo e indelével rasto
Que o não vivido deixa.
Não creias na demora em que te
Vai sempre mais á frente
Do que o teu próprio passo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
quarta-feira, 29 de agosto de 2007
Língua
Caetano Veloso
© Thony Barboza
Gosto de sentir a minha língua roçar
A língua de Luís de Camões
Gosto de ser e de estar
E quero me dedicar
A criar confusões de prosódias
E uma profusão de paródias
Que encurtem dores
E furtem cores como camaleões
Gosto do Pessoa na pessoa
Da rosa no Rosa
E sei que a poesia está para a prosa
Assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior
E deixa os portugais morrerem à míngua
"Minha pátria é minha língua"
Fala mangueira!Fala!
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Vamos atentar para a sintaxe dos paulistas
E o falso inglês relax dos surfistas
Sejamos imperialistas
Vamos na velô da dicção choo choo de Carmen Miranda
E que o Chico Buarque de Holanda nos resgate
E - xeque-mate - explique-nos Luanda
Ouçamos com atenção os deles e os delas da TV Globo
Sejamos o lobo do lobo do homem
Adoro nomes
Nomes em Ã
De coisas como Rã e Imã
Nomes de nomes
Como Scarlet Moon Chevalier
Glauco Matoso e Arrigo Barnabé
E Maria da Fé e Arrigo Barnabé
Flor do Lácio Sambódromo
Lusamérica latim em pó
O que quer
O que pode
Esta língua?
Incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Se você tem uma idéia incrível
É melhor fazer um canção
Está provado que só é possível
Filosofar em alemão
Blitz quer dizer corísco
Hollyood quer dizer Azevedo
E o Recôncavo, e o Recôncavo, e o Recôncavo
Meu medo!
A língua é minha pátria
E eu não tenho pátria: tenho mátria
E quero frátria
Poesia concreta e prosa caótica
Ótica futura
Samba -rap, chiclete com banana
Será que ela está no Pão de Açúcar?
Tá craude brô você e tu lhe amo
Qué queu te faço, nego?
Bote ligeiro
Nós canto-falamos como que inveja negros
Que sofrem horrores no gueto do Harlem
Lívros, discos, vídeos à mancheia
E deixe que digam, que pensem e que falem...
Party ' s over
As férias terminaram
As férias terminaram e guardarei, com absoluta causa e relativa consequência, cada momento destes dias maravilhosos. Ontem, a meio da noite, a natureza fustigou a cidade de Genebra com chuva, trovoada, raios e corriscos. Os quatro elementos de um vendaval. Seria um sinal. Ou não o sendo, quis tanto decifrar as sêmeas em tudo e isso é prodigioso. E tu eras, como és e serás sempre, o momento quintessencial de tudo. Genebra, poupemos adjectivos, é cidade que a minha mãe adorava. Algo perto do sublime. Em Paris, na trepidação do Trocadero, senti que andavas ao meu lado. Tu és uma espécie do Outro, de Jorge Luis Borges. Naturalmente que os transeuntes da Cidade Luz, habituados ao french kiss e aos embevecidos do Bateau Mouche, não repararam nas sombras. Tão pouco sabem dos labirintos…da alma. Também por isso, das tuas miradas furtivas, cúmplices, tão tuas. Hoje, sei que há olhares que abalam o mundo, mais, muito mais do que os 10 dias que impressionaram John Reed. Momentos há, tanto como lugares, que me prendem para sempre…
As responsabilidades a caminho
Entrementes, vou ao http://www.ipetitions.com/ e assino o "SOS PRAIAS DE CAPITAL", petição em defesa das praias da capital. Telefono a Felisberto Vieira, dando os parabéns pelo PDM. Retomo a escrita do texto sobre « As Relações Ceará – África e o Papel Intermediador de Cabo Verde », tese para dissertação de Mestrado. Ultimo o texto sobre Pedro Cardoso, que sairá em forma de livro. Igualmente, tenho a responsabilidade de escrever a introdução e as notas interiores das "Actas do Simpósio sobre o Centenário da I Geração do Movimento Claridoso". Envio uma crónica para o Jornal “A Nação”, que se inaugura na primeira semana de Setembro. E me assumo colaborador assíduo deste novo semanário…
Bzzz de Bússula e outros mais
E porque também há boa nova: serei em breve entronado como Membro Correspondente da Academia Cearense de Letras e Membro da Sexta Literária de Fortaleza. Coisas de Dimas Macedo, Poeta e Procurador, com pergaminhos para Cônsul Honorário de Cabo Verde no Ceará. Creio que se optou por outros arranjos. Mas Dimas é Midas, em várias medidas. Adiante…Com três livros acabados – “C/Sem Margens” (cronicas), “Bzzz de Bússula” (poesia) e “Praiademincidade” (romance) -, experimento uma pequena angustia da indecisão.
Abraão Vicente dixit
Ter-me-ias dito choveu esta madrugada e a manhã toda. E imagino-te a dormir com as janelas abertas. O besteirol de Mário Almeida há de me chamar hermético. Vê-se que é alguém que não se masturbou em tempo dos lobos. Too bad. Mais uma vez, concordo com o Abraão Vicente, mais substantivo do que os betinhos, neoradicais, lobinhos e seus afluentes, de pequenas causas. É assim no Ala Marginal: vamos dar uma nova cara ao país, digo-te apenas que minha ideia não passa pelas batucadeiras (de quem gosto muito,mas…), vamos ser ambiosos, dar um salto…enfim ser civilizados…
terça-feira, 28 de agosto de 2007
quinta-feira, 23 de agosto de 2007
Ambiente
Recomendo a leitura do livro « Ambiente », de Jorge Barbosa. Mais do que qualquer outro poeta, Barbosa tinha a dimensão da transcendência da natureza. Alinho-me inteiramente a isso. Pessoalmente, nesta quietude de Cressy, vivo um periodo de quântica poética, em autêntica osmose com o Ambiente. É que as regiões mais recônditas e as coisas mais infimas do mundo são os homens e a sua multiplicidade.
sábado, 18 de agosto de 2007
O bilinguismo nosso de cada dia
0.
Não apenas a missa, mas a Biblia devia vir em crioulo. Igualmente, a intervenção no Parlamento e a propria Constituição Nacional reclamam uma versão em língua cabo-verdiana. Quanto mais, o anuncio nos voos da TACV, depois do inglês, do francês e do português. Para não falar dos hospitais, dos tribunais e das escolas primárias. Disse "escolas"? Agora, com a reentrada do ano escolar, eis um debate a ter: a língua cabo-verdiana. Ou, com mais propriedade: o bilinguismo nosso de cada dia...
1.
Fernando Pessoa dizia, em toda a grandeza, "a minha pátria é a língua portuguesa". Direi, ja sem originalidade, nem aspas, mas com a mesma grandeza, que a a minha pátria é a língua cabo-verdiana. A língua portuguesa, que amo muito e me da relativa ressonancia, é a minha segunda natureza. A minha natureza uterina e primordial é crioula. Em consequência, e por muito mais, defendo a oficialização do crioulo.
2.
A língua, por ser muito importante, tem de ser também encarada como uma questão política da primeira grandeza. Por isso, o Estado não se deve demitir da sua função constitucional de desenvolver a língua cabo-verdiana, em prol da construção progressiva de um real bilinguismo. A Constituiçao Nacional afirma, como ditame até, que deverão ser criadas as condições para a a língua cabo-verdiana seja oficializada, em paridade com a língua portuguesa. Como sexta língua mais falada no mundo [210 milhões], o português não é apenas um valor cultural inestimavel, mas um recurso estratégico fundamental para o desenvolvimento e a inserção no mundo globalizado.
3.
O chinês é a língua mais falada do mundo [850 milhões], enquanto língua materna. O inglês é a língua mais falada, mas como segunda língua e não como língua materna. Em segundo lugar está o hindi [400 milhões], em terceiro o espanhol [390 milhões] e só em quarto lugar é que aparece a língua inglesa [354 milhões]. Em quinto lugar está o árabe [272 milhões] e em sexto a língua portuguesa. Dominar o português significa estar bem posicionado na geopolítica da língua. E não so...
4.
Haverá uma elite, a qual não se deve levar tão a sério, que se reproduz à roda da mais vil alienação e que encara o crioulo como o grande mal ao mundo. Para esta elitezinha, sem causa, nem consequência, é de somenos importancia que o crioulo seja realmente a língua do quotidiano cabo-verdiano e o elemento matricial da identidade nacional. Aliás, parasitária e medíocre, a descaracterização da caboverdianidade tornou-se a grande chance.
5.
Quanto à fala, estamos conversados. Nada de falácias, meus senhores. Cada um fala como fala, em sua região ou ilha. Não se impõe fala a ninguém. O que se pretende convergir, unificar e padronizar, em termos gramaticais e sistémicos, é a escrita. Com ou sem kapa, no fonologico ou no etimologico, à esquerda ou à direita, aos badius e aos sampadjudos, impõe-se-nos a todos esta defesa, valorização e desenvolvimento da língua materna cabo-verdiana e incentivar o seu uso na comunicação escrita.
6.
E o debate está lançado. Todos com direito à palavra. E, sobretudo, à lingua. Ao bilinguismo. Para mim, dizer o que penso é fundamental. É um acto tão natural como respirar – e não concebo que seja de outra forma. Esta liberdade às vezes não cai bem na Tapadinha. Num país com uma sociedade civil subsidiária directa ou indirectamente do Estado, onde todos se conhecem e se encontram no quotidiano, a independência de espírito vê-se condicionada pela desdita de tal elitezinha. Arre...
quinta-feira, 16 de agosto de 2007
Estios - perdidos & achados
O cheiro a café mistura-se a chocolate e a pão quente. Chemin de Carabout. Faz uma manhã de griso. E chove. Os poetas arrogantes são tigres de papel. Leio, quase a rir, dos versos online com que, em desagravo, te homenagearam, meu poeta. Gostei tamhém foi do Abraão que exortou à Eileen a não se deixar levar pelos tremeliques da canalha. Importa não ser intelectual com respiração assistida. E aqui à mesa: o ovo meio cozido, passado a manteiga. A salada de frutas. Pressinto a tua imagem e vale mais amar que ser doutrem amado. Temos sido estios perdidos, que foram longos anos de me alombar contigo. Tudo é cumulativo - dos Alpes aos montes da minha terra. Deitar novas achas à fogueira, quem sabe. Mas, olha, não me meço em tantas demoras, estando tu à minha espera. E, como diria Sophia de Mello Breyner Andresen, não creias, Lídia, que nenhum estio, por nós perdido possa regressar...
quarta-feira, 15 de agosto de 2007
Thonon les Bains
Em Rhone-Alpes - Haute-Savoie, mais precisamente em Thonon les Bains, as flores, como os repuxos, estão em viço nos jardins. Uma grande avenida, recortada sempre à beira do Lago Léman, fez-nos passear deste lado da França. Além, quase na divisa dos nossos olhos, a "promenade" de Lausanne. No Inverno, Rhone-Alpes serve para esquiar. No Verão, é navegar pelas águas. Mas, no ar e quando venta, o remanso de perfumes antigos...
domingo, 12 de agosto de 2007
O letreiro do Hotel de la Paix
De tudo, fica um pouco: fiapos de Baudelaire,
Imagens e manchas de ti no meio do lago,
Fio de lágrima escorrido, esse fogo de artifício,
Pegadas em mim do que foste, sobretudo...
Bocados de Rossini, de Verdi e de Respighi,
Teu gostar de prata, de viagem e de nuvem,
Esse ainda brilho com que ouvias, encantada,
Como eu vira, lindas, auroras de Marraquexe...
Ficam, de teres vivido, teu halo de Mystère,
Esse élan de seres afinal esfinge, musa e lira,
E na luz do teu sorriso - Codigo de Da Vinci...
As montanhas de Cabo Verde, estas ficam
E navegam comigo tempos e lugares, estas,
Quais cisnes, o letreiro desse hotel, que és tu...
sexta-feira, 10 de agosto de 2007
Eileenístico
O Ródano e o Oceano - adeus a Vário
De vez em quando, o fim da linha,
Por ter muito de infinito, é poema,
Como teu verso, de metáfora e meia,
Soletraria fossemos nós uno e vário...
Em tese, não haverá enfim morte,
Nem outra sorte, rosa ou cotovia,
Lua toda e parte nossa em desvario,
Que não balbuciasse esta alquimia...
Lago, espelho de água que desliza,
Códice da letra, da terra, da palavra,
Que lavra lágrima e ciência da beleza...
Sendo Ródano, mas tambem Oceano,
Tudo sendo nada e, no vagar, lugar
Onde sinta o mundo e te faça adeus...
Por ter muito de infinito, é poema,
Como teu verso, de metáfora e meia,
Soletraria fossemos nós uno e vário...
Em tese, não haverá enfim morte,
Nem outra sorte, rosa ou cotovia,
Lua toda e parte nossa em desvario,
Que não balbuciasse esta alquimia...
Lago, espelho de água que desliza,
Códice da letra, da terra, da palavra,
Que lavra lágrima e ciência da beleza...
Sendo Ródano, mas tambem Oceano,
Tudo sendo nada e, no vagar, lugar
Onde sinta o mundo e te faça adeus...
quinta-feira, 9 de agosto de 2007
Arte facto
American, born 1937
Filas for Sale (Nigerian Impression Series), 1972
Acrylic on canvas
72 x 52
The Museum of the National Center of Afro-American Artists
Filas for Sale (Nigerian Impression Series), 1972
Acrylic on canvas
72 x 52
The Museum of the National Center of Afro-American Artists
Linhas da Alma
Entre todas as linguagens com as quais a sociedade reveste as suas intenções e as suas formas, parece ser a arte aquela que agrega o melhor conjunto de valores e o mais sofisticado de todos os apelos.
Acredito ser impossível apreciar a arte de boa qualidade e não desejar tê-la para si, uma vez que a arte é a extensão do nosso imaginário e do nosso desejo de estar-no-mundo e de lutar até onde as energias da vida possam permitir.
A arte atravessa os caminhos escuros do nosso inconsciente e, na proporção em que se vai tornando soberana, projeta no espaço do nosso exterior o caleidoscópio no qual nos espelhamos. E não há como fugir da sua linguagem sedutora, da sua tentação desafiante e dos lençóis de linho com os quais ela nos envolve.
Ana Costalima é uma artista plural e multifacetada. Toca os mais diversos instrumentos da escansão poemática e vai da gravura e da escultura do ferro à pintura de linhagem clássica que aponta para o limite de todos os desejos.
E sabe manipular, como poucos, o desenho de linhas abstratas e a alquimia das formas como se fosse uma equilibrista que caminha por fios de arame sem a necessidade de nenhum elemento de apoio.
A escultura, de longe, parece ser o seu supremo campo de domínio, mas não é. Ana Costalima é mais do que aquilo que aparenta ser e muito mais ainda do que aquilo que dela se possa imaginar, isto é, é mais do que aquilo que a sua exposição - Linhas da Alma - pode revelar.
Mas é em Linhas da Alma, acredito, que ela demonstra, como poucos, o quanto é possível transformar as estruturas pesadas dos materiais resistentes em folhas laminadas em branco e em linhas que apontam para as grandes levezas da vida.
A dança das formas resistentes, a leveza significante do traço, o desenho simbólico da sinergia da alma, a comandar o prazer e o deleite dos apreciadores, são valores e achados com os quais Ana Costalima nos encanta.
Todos os recursos da criação artística que até hoje lhe foram facultados ela os reuniu nos objetos que constituem essa exposição.
Um crítico de arte talvez aqui quisesse inventar teorias ou escolas, tendências estéticas ou didáticas para enquadrar as suas perspectivas de trabalho. Mas não é isto o que penso a respeito da sua criação cultural. Acho tão-somente que Ana Costalima é uma artista de traços criativos, que prima pela leveza da forma e do desenho, que sabe que a energia suprema da vida é o amor e que os desafios da arte de viver implicam, necessariamente, em tomar a criação ponto de partida.
E a criação como ponto de partida é tudo o que importa a Ana Costalima, especialmente quando se debruça sobre o ofício de escrituração do poema. É poetisa, sim, e escritora, no sentido mais justo da palavra.
Desliza, como poucos, pelas linhas do imponderável. Não é uma engenheira do poema, no sentido cabralino do termo. Não escreve pela emoção, mas pelo ouvido. Compreende sinais, interpreta signos, fixa a atenção num ponto qualquer do horizonte, desce olhar sobre o papel e o poema explode em forma de canção e de resguardo de sua doce sensibilidade.
Faz poemas como se estivesse ouvindo alguma partitura. Vozes musicalizadas. Melodias sonoras. Texto preparado para a escansão e para as grandes energias do corpo.
A palavra, em Ana Costalima, constitui a sedução de todos os prazeres. O movimento, o alento, o alimento, nesta ordem de partida do zen oriental, integram a sinergia do texto que ela nos dirige.
É impossível olhar para Ana Costalima e não sentir. Olhar para Ana Costalima e não criar.
Quem a percebe, pela primeira vez, não tem como evitar os seus olhos e a sua efusão em abraçar. Tudo nela é poesia e determinação. Tudo, em Ana Costalima, me parece a expressão poética do desejo, assim como se tece a melodia que se perfaz na concha e no rumor.
Serviço:Abertura da exposição ´Linhas da Alma´, de Ana Costalima, hoje, às 20 horas, no Centro de Convivência da Unifor. Informações: (85) 3477 3239.
Ruy Duarte de Carvalho (*) lembra João Vário
..... morreu ontem, no Mindelo, o João Vário, o cientista Varela, que era como a gente se referia a ele nesse tempo a seguir à independência quando andou por Luanda a não entender nada como muitos de nós, uns mais em segredo e outros nem tanto, mas a olhar para tudo quase sempre a rir e sem perder a compostura dele, que era assim a de uma figura em que as pernas só é que avançam para a frente e sustêm o peso de um corpo em andor, virado para o chão dos ombros para cima...
PARA UM CIENTISTA VÁRIO
.... é injusto que o mérito do que escreveu, por razões evidentes, basta decifrar-lhe a dimensão, tenha passado ao lado dos critérios que podem assegurar notoriedade a uma obra, e com ela nem tanto a glória vã mas tão-só apenas talvez uma qualquer hipótese de intervenção, enquanto o que foi deixando escrito não terá nunca deixado, já se vê, de acionar os dos juízos que governam e comandam o mundo, os da lisonja e do serviço a esses,os do medo, os do despeito, os da inveja e dos oportunismos vis...
.... calha que ele morre enquanto ando à volta da figura de Ernst Junger, que também andou por Angola e eu cruzei com ele... esse era, para além de ter sido quem foi como escritor, um entomologista desvairado, com dois espécimes, no catálogo das descobertas do século vinte, batizados com o nome dele : um é o Trachydora juengeri e o outro a Cincidela juengeri.
... autor tão tido em conta como ele era, ouvi-lhe em Calulo, no ano em que a minha filha Eva nasceu lá também : ’... é talvez a única coisa que ficará de mim... Lineu trabalhou para a eternidade...
.... também o doutor João Varela, se não o poeta João Vário, ficará seguramente para a história... consta que durante certo tempo da sua vida foi cirurgião eminente de operações ao crânio das pessoas e que durante os seus trabalhos de tese, na Holanda, chegou até a formular qualquer coisa capaz de assegurar-lhe, também a ele, a eternidade... quando lhe fui apresentado em Luanda, talvez para aí em 77, o também finado já, mas esse há muito, saudoso Africano Neto, assegurou-me estar em presença, precisamente e sem mais, nem menos, do inventor do síndrome de Varela... é pouco para ele... e ainda assim é triste... mas é bem-feito e consola...
* * escritor angolano, autor, entre outros, de Os papéis do inglês, Como se o mundo não tivesse leste, Hábito da terra... O presente texto saiu no jornal Público.
Semana Online
PARA UM CIENTISTA VÁRIO
.... é injusto que o mérito do que escreveu, por razões evidentes, basta decifrar-lhe a dimensão, tenha passado ao lado dos critérios que podem assegurar notoriedade a uma obra, e com ela nem tanto a glória vã mas tão-só apenas talvez uma qualquer hipótese de intervenção, enquanto o que foi deixando escrito não terá nunca deixado, já se vê, de acionar os dos juízos que governam e comandam o mundo, os da lisonja e do serviço a esses,os do medo, os do despeito, os da inveja e dos oportunismos vis...
.... calha que ele morre enquanto ando à volta da figura de Ernst Junger, que também andou por Angola e eu cruzei com ele... esse era, para além de ter sido quem foi como escritor, um entomologista desvairado, com dois espécimes, no catálogo das descobertas do século vinte, batizados com o nome dele : um é o Trachydora juengeri e o outro a Cincidela juengeri.
... autor tão tido em conta como ele era, ouvi-lhe em Calulo, no ano em que a minha filha Eva nasceu lá também : ’... é talvez a única coisa que ficará de mim... Lineu trabalhou para a eternidade...
.... também o doutor João Varela, se não o poeta João Vário, ficará seguramente para a história... consta que durante certo tempo da sua vida foi cirurgião eminente de operações ao crânio das pessoas e que durante os seus trabalhos de tese, na Holanda, chegou até a formular qualquer coisa capaz de assegurar-lhe, também a ele, a eternidade... quando lhe fui apresentado em Luanda, talvez para aí em 77, o também finado já, mas esse há muito, saudoso Africano Neto, assegurou-me estar em presença, precisamente e sem mais, nem menos, do inventor do síndrome de Varela... é pouco para ele... e ainda assim é triste... mas é bem-feito e consola...
* * escritor angolano, autor, entre outros, de Os papéis do inglês, Como se o mundo não tivesse leste, Hábito da terra... O presente texto saiu no jornal Público.
Semana Online
terça-feira, 7 de agosto de 2007
Joyce
Estava na cara, como pelo sobrenome - Correia e Silva -, sermos primos. Mas o nome era lindo, quase título de um romance a escrever: Joyce. Tinha apenas 18 anos, nascera na Holanda e vinha sempre beber na fonte da cabo-verdianidade. Sei que tinha planos, muitos planos. E, quem sabe amava alguém, como se ama nessa idade! Soube, pelos jornais, do desastre mortal que a vitimou, ali perto do Monte Negro, Santa Cruz.
Em memória de Joyce deixo estes versos de Fernando Pessoa:
Nunca supus que isto que chamam morte
Tivesse qualquer espécie de sentido...
Cada um de nós, aqui aparecido,
Onde manda a lei certa e falsa sorte,
Tem só uma demora de passagem
Entre um comboio e outro , entroncamento
Chamado o mundo, ou a vida, ou o momento;
Mas, seja como for, segue a viagem.
segunda-feira, 6 de agosto de 2007
A contarem das sêmeas
Fui às pracetas, onde nem poemas, só pombos
Soletravam à beira dos charcos, nas gretas da rua,
Bêbados, nem todos noctívagos, nem felizes,
Bebiam mágoas – ora euforias, ora metáforas,
E vi ali ainda poetas, dos que sofrem palavras,
A contarem das sêmeas o soçobrar dos versos
E dos bocados de sílabas, pela inércia surda,
Retirei ali retratos da tua nudez e, em surdez,
Já de serem só silêncios e sonetos as sobras,
Mais do que pracetas, terços e tercetos, viagens,
Nuvens que nem fonemas, quase morfemas,
Tuas broas, loas e outras ilusões, tão fêmeas
Tais flores nos jardins dos reversos, inversos
De nada. De tudo. De nada, afinal…
Soletravam à beira dos charcos, nas gretas da rua,
Bêbados, nem todos noctívagos, nem felizes,
Bebiam mágoas – ora euforias, ora metáforas,
E vi ali ainda poetas, dos que sofrem palavras,
A contarem das sêmeas o soçobrar dos versos
E dos bocados de sílabas, pela inércia surda,
Retirei ali retratos da tua nudez e, em surdez,
Já de serem só silêncios e sonetos as sobras,
Mais do que pracetas, terços e tercetos, viagens,
Nuvens que nem fonemas, quase morfemas,
Tuas broas, loas e outras ilusões, tão fêmeas
Tais flores nos jardins dos reversos, inversos
De nada. De tudo. De nada, afinal…
quinta-feira, 2 de agosto de 2007
Balanço
Caros Amigos,
Doravante (e por alguns dias), estarei mais bissexto do que o habitual. Motivo de férias, com os meus filhos, Denzel e Pablo. Igualmente, tempo para repensar em muita coisa – formação, profissão, política, arte e vida sentimental. Tentarei ser contido e sucinto para comigo. Já não tenho idade para ser (e estar) caudaloso. Vou Blogar, de vez em quando. Só de vez em quando…prometo.
Doravante (e por alguns dias), estarei mais bissexto do que o habitual. Motivo de férias, com os meus filhos, Denzel e Pablo. Igualmente, tempo para repensar em muita coisa – formação, profissão, política, arte e vida sentimental. Tentarei ser contido e sucinto para comigo. Já não tenho idade para ser (e estar) caudaloso. Vou Blogar, de vez em quando. Só de vez em quando…prometo.
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