domingo, 8 de junho de 2008

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A gana e a sana dos momentos

Há uma semana, estava mais taciturno e estranho a cogitar sobre o papel do esquecimento, descrito por Kundera, e o da amnésia, estruturado por Freud. O que nos salva depois de um trauma é a memória selectiva e vi-o agora, longe de tudo e de todos. A de alinharmos, para o nosso próprio bem, a via da sublimação e não da depressão. O “dar a volta por cima” ou, qual Fénix, o renascer das cinzas tem a ver com a nossa atitude existencial de encarar os desafios que nem sempre são fáceis de vencer, mas importantes de enfrentar. Uma semana depois, estando na beirada do rio Tejo num solilóquio mais que necessário, sinto roçar nos meus ombros a fímbria ancestral do dilema camoniano – a gana de Vasco da Gama e a sana do Velho de Restelo. É preciso continuar a navegar!


Coisas de Airton Monte

O poeta brasileiro Adriano Espínola escreveria assim: "A minha pátria é o meu corpo, pulsando por entre porradas e carinhos quotidianos, palco carnal do sentido e do desejo, repartido entre vísceras e sonhos, sedento do agora e faminto do mundo, navegante à deriva do possível e do precário". Lembranças do meu confrade, Airton Monte, em Fortaleza. Ele sempre a precisar que a vida, sem poesia, é que nem baião de dois sem feijão, nem arroz…

Futebol

Assisti, com drama e sofreguidão, pela Sport TV 1, o jogo entre Portugal e a Turquia. Igualmente, estava antenado, através da RCV, ao Estádio da Várzea, onde Cabo Verde defrontava a Tanzânia. Não perco esperanças de permanecer na Copa Africana das Nações, nem perco fé de ir longe no UEFA Euro 2008. Em verdade, Cabo Verde vence por 1-0 e Portugal por 2-0. Fico contente. Em júbilo. E estranha-me este súbito entusiasmo pelo futebol e este sentimento de proximidade (e de alinhamento) entre Cabo Verde e Portugal, outrora adormecido, mas que lateja ora em mim…com drama e sofreguidão.

Dia de Portugal

O Centro Cultural Português da Praia, uma vez mais, nos brilha com uma iniciativa de altíssima qualidade. Maria João e Mário Peixote, no Auditório da Assembleia Nacional, para um espectáculo intitulado “Pele”, no âmbito do Dia 10 de Junho – data nacional portuguesa e das comunidades da língua portuguesa. Com letras de Tiago Torres da Silva, Eugénia de Vasconcellos e do próprio José Peixoto, os dois protagonistas não fazem vénias apenas ao jazz e à música portuguesa, mas vagueiam pela música planetária onde as fronteiras se esbatem e os homens se abraçam. Em "Pele", eles nos dizem que a Terra afinal é pequena, mas que o mundo continua (ainda bem) vasto e diverso.

Cahier d’ un retour au pays natal

Nunca se vem tarde à homenagem a um poeta maior. Hoje, domingo aparentemente tranquilo (os tubarões estarão adormecidos ainda?), vou à estante e retiro algumas obras de Aimé Cesaire. Que grande poeta! Que grande humanista. Que grande combatente: Pois então, palavras, mas palavras de sangue fresco, palavras que são maremotos e erisipelas e paludismos e lavas e fogos dos matos, e o chamuscar da carne e o flamejar da cidade. Fixai bem: Não jogo nunca se não for ao ano mil Não jogo nunca se não for ao Grande Terror Ficai à vontade comigo. Eu não o ficarei convosco…

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