terça-feira, 18 de setembro de 2007

Dispersão qualquer do sujeito

Desajuste

Ao vosso claro desajuste, acusavas esse homem de ser poeta. Preferias que ele fosse empresário, tropa ou funcionário público. Fosse ele bastonário de alguma ordem, deputado, médico ou mesmo psicólogo. Lobo do homem, se possível. Mas poeta, minha gente. Vá lá que o homem conseguia, a custo, ser amante. A sua conta bancária, um deserto. Dir-se-ia alucinado pela floresta das palavras. Um louco em todo o senso. Ao vosso mais que desajuste, dizia, queria ele que soubesses coisas como a dor de uma simples rosa e a ternura de um solitário da alma. Ser poeta é o susto das horas desiguais e dos lugares que sonhamos. Haverá para o poeta uma dispersão qualquer do sujeito à busca do objecto refractário da loucura. Como dizia Álvaro de Campos “Amanhã é dos loucos de hoje”.

Pedro Cardoso

Como encanta ler Pedro Cardoso. Sem óculos de Manuel Ferreira, naturalmente. Esse sentir Cabo Verde, tenhamos em mente, não foi invenção da Claridade. A bem dizer, ele perde-se na nossa memória ontológica. Tudo o que foi escrito pelos intelectuais do século XIX e os primeiros anos do século XX tem a ver com a problemática da terra. Na robusta prosa ou no inventivo verso, o espaço dos nativistas eram as ilhas com os seus dramas. Quando não, acções cívicas e com autodeterminação.

Existencial

Às vezes, pergunta-se qual a obrigação de amar este lugar sobre todas as coisas. Outras vezes, questiona-se isso de poeta com os pés fincados no chão. Em verdade, o poeta é o solitário de passagem. E a sua solidão é uma poeira suspensa. Ou o vagar da penugem em longa viagem. A solidão é nuvem, vista no silêncio desta janela. A lembrança do branco de um pássaro. A luz, meio fugaz, de uma outra claridade. A angustiosa página em branco. Sem poema, nem fonema…

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