por Filinto Elísio
Ceia
Estaremos todos, adultos, adolescentes e crianças, na noite da consoada que a dona Mindoca nos prepara. A tribo reunida (netos, filhos, pais, irmãos, tios, primos e amigos) a comemorar, sob o pretexto da natividade divina, o sermos uma família. Em certos momentos, tudo o que reluz é ouro. Os olhos das crianças diante das prendas, o sorriso dos mais velhos e a voz que vem de um silêncio que não conto. Estariam cá os que já partiram, mas que na moldura maior são parte da festa. Inevitável uma certa tristeza pelas crianças de Falluja. Por todas as crianças do mundo que, devido às circunstâncias, enfrentam a guerra, a miséria e a doença. Enquanto Santa (Pai Natal ou raio que o parta), escolhe uns poucos para a comédia do costume. Arrepia um bocado…e não é do friozinho que, do terraço da dona Mindoca, afirma estar o ano a dar o berro…
Ano – encontros e desencontros
Estiveram apenas por um lapso de tempo. Um ponto. Coisinha de nada. Não deu para falarem sobre os anos que, como as ondas, rolam ainda nas praias da memória. Nem deu para juntos olharem a lua e a sua esplêndida beleza. Os encontros são marcados pelos desencontros. Se alguém faz trocadilho dos termos, palavra que não é este que assina a crónica…
Se oriente, rapaz
2004 foi um ano daqueles (Simpósio Internacional Amílcar Cabral, MCA e PDM). A ventura de estar com Gilberto Gil. Eu o conhecia desde a infância. De nome, de estória e de música. A criançada a cantar Oriente: (…) Pela curiosidade de ver/Onde o sol se esconde/Vê se compreende/Pela simples razão de que tudo depende/De determinação (…). Ver Gil e Veiga (Manuel, naturalmente) a dançar na Praça Alexandre Albuquerque deixou cá dentro uma impressão bonita. Uma luzinha bonita acende-se no fundo do túnel. É pela cultura (deixemo-nos de tretas) que este país tem caminho para andar…
Revelados
Os Rabelados de Espinho Branco gravaram as suas ladainhas em CD, uma produção da Comissão para os Direitos Humanos e Cidadania. As ladainhas são rezas cantadas que os Rabelados entoam a pedir graça aos santos. Pela importância cultural da iniciativa, vale aqui dar os parabéns a duas amigas imprescindíveis: Mizá e Vera Duarte.
Mar & Luz, vidas paralelas
Quem somos senão vasculhadores das nossas partes deixadas aos lugares e aos tempos? O regresso é entrar num espelho e caminhar numa espiral inversa. O teu nome diz tudo, pré figura o instante que és e o resto é o resto. E nessa procura somos parte daquela música cantada por Milton Nascimento (Guardanapos de Papel): (…) Na minha cidade tem poetas, poetas/Que chegam sem tambores nem trombetas, trombetas/E sempre aparecem quando menos aguardados, guardados/Entre livros e sapatos, em baús empoeirados (…). O que sobra, Mário, são as notícias do bloqueio. Elas existem…
Para o menino Tony
Há quem confunda alhos com bugalhos e tome nuvem por Juno. Há de tudo neste mundo de Deus: desde santo que não faz milagre a gente que queima santo. Há também gente que com o diabo fez contrato. Assessorou o demo nas suas travessuras e caboverduras. Isto é assim: ou dizemos «olá, como vai» e vamos à vida, ou nem todos são filhos da santa. Haja estômago! De resto, tudo não passa de fábula. Lobos, cabras, leões, tubarões, todos no palanque da brincadeira. E não faltam ratos, bodes e burros, gregos e troianos, arianos e plebeus, um grande Carnaval de generais, para a grande alegoria (direi mesmo ironia) que o destino nos reservou. E a raposa (o menino sabe), nas suas deambulações, topou um saboroso e abandonado cacho de uvas a cair da videira. Lobo armado em cordeiro, o gajo haveria de dizer «estão verdes». Era mais ou menos nesta linha a fábula de La Fontaine. Além do mais, tudo vale a pena quando a alma é pequena, dirá o menino Tony…
Resolução do Ano Novo
Ler a colecção completa de Eduardo Lourenço, que me ofereceram. Ser escandalosamente feliz. Reunir a tribo sempre que possível. Sentir Cabo Verde como parte do mundo. Ser tudo, menos claridoso. Escrever um ou dois livros. Continuar a dar mais, muito mais, do que a receber…
Boas Festas
E venha daí aquele abraço. O leitor tem sempre razão. É cliente, ao fim e ao cabo…
Estaremos todos, adultos, adolescentes e crianças, na noite da consoada que a dona Mindoca nos prepara. A tribo reunida (netos, filhos, pais, irmãos, tios, primos e amigos) a comemorar, sob o pretexto da natividade divina, o sermos uma família. Em certos momentos, tudo o que reluz é ouro. Os olhos das crianças diante das prendas, o sorriso dos mais velhos e a voz que vem de um silêncio que não conto. Estariam cá os que já partiram, mas que na moldura maior são parte da festa. Inevitável uma certa tristeza pelas crianças de Falluja. Por todas as crianças do mundo que, devido às circunstâncias, enfrentam a guerra, a miséria e a doença. Enquanto Santa (Pai Natal ou raio que o parta), escolhe uns poucos para a comédia do costume. Arrepia um bocado…e não é do friozinho que, do terraço da dona Mindoca, afirma estar o ano a dar o berro…
Ano – encontros e desencontros
Estiveram apenas por um lapso de tempo. Um ponto. Coisinha de nada. Não deu para falarem sobre os anos que, como as ondas, rolam ainda nas praias da memória. Nem deu para juntos olharem a lua e a sua esplêndida beleza. Os encontros são marcados pelos desencontros. Se alguém faz trocadilho dos termos, palavra que não é este que assina a crónica…
Se oriente, rapaz
2004 foi um ano daqueles (Simpósio Internacional Amílcar Cabral, MCA e PDM). A ventura de estar com Gilberto Gil. Eu o conhecia desde a infância. De nome, de estória e de música. A criançada a cantar Oriente: (…) Pela curiosidade de ver/Onde o sol se esconde/Vê se compreende/Pela simples razão de que tudo depende/De determinação (…). Ver Gil e Veiga (Manuel, naturalmente) a dançar na Praça Alexandre Albuquerque deixou cá dentro uma impressão bonita. Uma luzinha bonita acende-se no fundo do túnel. É pela cultura (deixemo-nos de tretas) que este país tem caminho para andar…
Revelados
Os Rabelados de Espinho Branco gravaram as suas ladainhas em CD, uma produção da Comissão para os Direitos Humanos e Cidadania. As ladainhas são rezas cantadas que os Rabelados entoam a pedir graça aos santos. Pela importância cultural da iniciativa, vale aqui dar os parabéns a duas amigas imprescindíveis: Mizá e Vera Duarte.
Mar & Luz, vidas paralelas
Quem somos senão vasculhadores das nossas partes deixadas aos lugares e aos tempos? O regresso é entrar num espelho e caminhar numa espiral inversa. O teu nome diz tudo, pré figura o instante que és e o resto é o resto. E nessa procura somos parte daquela música cantada por Milton Nascimento (Guardanapos de Papel): (…) Na minha cidade tem poetas, poetas/Que chegam sem tambores nem trombetas, trombetas/E sempre aparecem quando menos aguardados, guardados/Entre livros e sapatos, em baús empoeirados (…). O que sobra, Mário, são as notícias do bloqueio. Elas existem…
Para o menino Tony
Há quem confunda alhos com bugalhos e tome nuvem por Juno. Há de tudo neste mundo de Deus: desde santo que não faz milagre a gente que queima santo. Há também gente que com o diabo fez contrato. Assessorou o demo nas suas travessuras e caboverduras. Isto é assim: ou dizemos «olá, como vai» e vamos à vida, ou nem todos são filhos da santa. Haja estômago! De resto, tudo não passa de fábula. Lobos, cabras, leões, tubarões, todos no palanque da brincadeira. E não faltam ratos, bodes e burros, gregos e troianos, arianos e plebeus, um grande Carnaval de generais, para a grande alegoria (direi mesmo ironia) que o destino nos reservou. E a raposa (o menino sabe), nas suas deambulações, topou um saboroso e abandonado cacho de uvas a cair da videira. Lobo armado em cordeiro, o gajo haveria de dizer «estão verdes». Era mais ou menos nesta linha a fábula de La Fontaine. Além do mais, tudo vale a pena quando a alma é pequena, dirá o menino Tony…
Resolução do Ano Novo
Ler a colecção completa de Eduardo Lourenço, que me ofereceram. Ser escandalosamente feliz. Reunir a tribo sempre que possível. Sentir Cabo Verde como parte do mundo. Ser tudo, menos claridoso. Escrever um ou dois livros. Continuar a dar mais, muito mais, do que a receber…
Boas Festas
E venha daí aquele abraço. O leitor tem sempre razão. É cliente, ao fim e ao cabo…
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