segunda-feira, 15 de janeiro de 2007

O que nada “separa” e outros apartes




O que nada “separa”

Uma notícia de jornal estampa a manchete “Genética ‘separa’ Barlavento e Sotavento”. O trabalho, coordenado por Hélder Spínola, do Laboratório de Genética Populacional da Universidade da Madeira, Portugal., investigou a composição genética de 120 pessoas do Barlavento e Sotavento. O mesmo confirmou o que sabíamos, ou seja que os de Barlavento têm mais haplotipos comuns a Portugal do que os de Sotavento. Esta pequena diferença natural terá a ver com as diferenças históricas de povoamento entre os dois grupos de ilhas. Digo “pequena diferença”, que de forma alguma separaria isto com aquilo, já que todos os estudos sobre as impressões genéticas vêm demonstrando que a variação no interior dos chamados grupos étnicos e outros é infinitamente maior do que a variação entre esses próprios grupos. O estudo, que tem aval científico e beneplácito das autoridades nossas, representaria um contributo para o estudo das doenças dos povos de expressão portuguesa e os dados permitirão descortinar a relação entre a genética da população e várias doenças. Eu nunca acreditei no “Bell Curve”…e o leitor?

Com ciência e consciência

Não é que se queira perder tempo com os reaccionários locais – até porque estes são mais mentecaptos e menos dignos de atenção do que o genérico dos reaccionários –, mas apetece perguntar o que explicaria uma certa visão filogenética de Cabo Verde? Remeto-lhes à leitura da vasta obra do geneticista italiano Luici Cavalli-Sforza que construiu uma colecção de ADN de populações das mais diversas partes do mundo para a realização de estudos comparativos sobre variabilidade genética. A sua obra desmotiva a qualquer interpretação etnocêntrica do processo genético e desmente o subjectivismo da supremacia racial. Ademais, a grande confirmação científica do Projecto Genoma Humano é que o homem surgiu realmente na África e se espalhou pelo resto do planeta. Enfim, é preciso colocar nas meras notícias dos jornais alguma ciência e muita consciência das coisas…

Out of Africa

Sobre a problemática genética, creio ser interessante a posição de Sérgio Danilo Pena, professor da Universidade Federal de Minas Gerais e titular da Academia Brasileira de Ciências. Para este ilustre professor o negro tem pele escura porque a sua região de origem tem um sol muito forte. A pele protege-se com a cor escura. Quando os nossos antepassados africanos migraram para a Europa, a pele foi clareando progressivamente para poder absorver uma quantidade maior de raios mais fracos, sem os quais não poderiam sintetizar a vitamina D. Sem essa vitamina, o ser humano ficaria raquítico. É só observar as populações da Europa hoje. Na região do Mediterrâneo, há pessoas com pele mais escura do que na Suécia. São adaptações puramente geográficas. Como os árabes e os judeus, que têm geralmente um nariz grande, necessário para humidificar o ar seco que respiram nos desertos. Então, o que percebemos como diferenças raciais são na verdade adaptações geográficas. Originalmente, o ser humano é um só. Hoje, já há um consenso de que todos os humanos possuem a mesma origem. É a chamada teoria "Out of Africa (saído da África) ": todos viemos de um antepassado africano.

Tatarana

Jorge Marmelo, escritor da melhor verve, escreve assim, no seu Blog:

(…) Se na estepe, ao longe, não me vês ainda – estou a chegar. Sigo diante dos leões e das impalas, das palancas e dos bisontes, das zebras e dos leopardos; vou à cabeça da caravana dos animais que hão-de ir ajoelhar-se à tua volta, senhora nossa, deusa deste chão. Levamos uma nuvem de pó no nosso encalço – hás-de avistá-la ao longe, é a flâmula que por ti erguemos com o vigor dos nossos pés. Levo as pinturas de guerra no corpo nu, a lança de caçar os pequenos roedores do deserto e o colar de contas que não me deste ainda. Espera. Sou teu (…)

A cerimónia do adeus

Não falemos das grandes coisas por uns instantes. Até porque há coisas tão profundas que não têm de ser necessariamente grandes. Falemos antes das circunstâncias que nos dilaceram a alma. A profunda e amarga desilusão perante as coisas. Mas eu sou um Albatroz e não ficarei preso aos grilhões dos navios. Que estranha sina me trespassa? Despeço-me, não sem muita tristeza, dos dias que foram inesquecíveis. É que as despedidas não deviam ser dolorosas (com sonoro bater de porta), mas são...




Sem comentários: