Por Filinto Elísio
Ao beijo dado numa rama da infância, beijo dado à tarde
- por ter sido das lembranças, Paraíso expulso, diria. Guardo-o,
amiúde, a ver se ele nos torna o que foi outrora. Não o levarei
pelas apressadas escadas onde me perco. Nem dele farei meu talismã,
sombra, só de água que reflecte, espelho, mas não conta,
e o mundo não basta aqui nos lábios , serás tu a serpentearia,
a dança que se enrosca nesta maça e nela não são músicas os silêncios
com que tu lanças olhos às coisas que se estremecem, lascivos, em mim
só de terem mãos de afagar e língua pelos mamilos, evado-me
mil e uma noites, pernas, braços, sexo, olhos, espasmos, corro
e não olho se percorro o dia, a noite ou a morte. Quem sabe outro,
outrora, flor de macieira, quasar desse perfume, e volátil
nas cores e nos líquidos, no que cede assim e rompe, e transborda,
extravasado beijo – numa rama da infância – e eu, distraído…
domingo, 30 de janeiro de 2005
Maçã
Por Filinto Elísio
Ao beijo dado numa rama da infância, beijo dado à tarde
- por ter sido das lembranças, Paraíso expulso, diria. Guardo-o,
amiúde, a ver se ele nos torna o que foi outrora. Não o levarei
pelas apressadas escadas onde me perco. Nem dele farei meu talismã,
sombra, só de água que reflecte, espelho, mas não conta,
e o mundo não basta aqui nos lábios , serás tu a serpentearia,
a dança que se enrosca nesta maça e nela não são músicas os silêncios
com que tu lanças olhos às coisas que se estremecem, lascivos, em mim
só de terem mãos de afagar e língua pelos mamilos, evado-me
mil e uma noites, pernas, braços, sexo, olhos, espasmos, corro
e não olho se percorro o dia, a noite ou a morte. Quem sabe outro,
outrora, flor de macieira, quasar desse perfume, e volátil
nas cores e nos líquidos, no que cede assim e rompe, e transborda,
extravasado beijo – numa rama da infância – e eu, distraído…
Ao beijo dado numa rama da infância, beijo dado à tarde
- por ter sido das lembranças, Paraíso expulso, diria. Guardo-o,
amiúde, a ver se ele nos torna o que foi outrora. Não o levarei
pelas apressadas escadas onde me perco. Nem dele farei meu talismã,
sombra, só de água que reflecte, espelho, mas não conta,
e o mundo não basta aqui nos lábios , serás tu a serpentearia,
a dança que se enrosca nesta maça e nela não são músicas os silêncios
com que tu lanças olhos às coisas que se estremecem, lascivos, em mim
só de terem mãos de afagar e língua pelos mamilos, evado-me
mil e uma noites, pernas, braços, sexo, olhos, espasmos, corro
e não olho se percorro o dia, a noite ou a morte. Quem sabe outro,
outrora, flor de macieira, quasar desse perfume, e volátil
nas cores e nos líquidos, no que cede assim e rompe, e transborda,
extravasado beijo – numa rama da infância – e eu, distraído…
segunda-feira, 24 de janeiro de 2005
Pedras
Filinto Elísio
Espumas que eras
A borbulhar nas espumas, tu
e eu, esquecidos dos enganos,
de serem as horas plácidas
e os lugares incaracterísticos;
Dos frutos olvidaremos os umbrais
com que das falésias uivam, de silvarem,
as brisas e os lobos e, de cantarem,
os lobisomens evadidos das tocas;
Seremos, noite e dia, este mistério
de haver olhar, como o luar, que se esvai
num mergulhado banho de nuvem;
Esta coisa não dita, apenas e um pedaço,
pressentidos corpos, fugaz encontro,
quando - o que existe - é tudo viagem…
Das pedras noutra margem
Soube das pedras – das mais preciosas, diria -,
e era-o topázio no teu peito e no elevador,
de onde se via Nova Iorque envidraçado,
pensei a vida toda dos teus seios;
Quis, a cada paragem, cantar as pedras
e, num manifesto, fazer das pedras meus versos,
a cor furtada ao brilho dos meus olhos
e o néon tremeluzente, tuas mãos;
Soube-as em dedos cuidados doutras musas,
em brincos e piercings fabulosos, no trote das deusas,
pelas montras e avenidas fabulosas, soube-as lindas;
Horas que se escapam das clepsidras e são areias,
inertes que se evaporam no néon da cidade
- topázio! – e continuam pedra, das pedras, em mim…
domingo, 23 de janeiro de 2005
Idade meio porn
Filinto Elísio
Eterna idade
Pronto! De nada adianta fingir, dizer que tudo vai bem e que a lida anda a fluir cor-de-rosssima. Fao anos e no estou preparado para a canga da idade. Releio os versos de Mrio Fonseca e concordo com o poeta: viver devia ser at vinte. Mais do que isso, sobreviver aos barrancos e trancas. Dizes que eu devia estar contente, ufano e glorioso, at aqui de trabalho, aceso na ribalta dos aplausos. Mas qual qu? Onde j se viu um poeta virar vaidoso por ter subido num pedestal qualquer? Onde j se viu um andarilho gramar os louros que enfeitam a leviana fronte dos heris? Crise dos quarenta, te confesso. Afrontas-me com isso de gostar dos frutos e deles soletrar os amores trespassados. Fingir que tudo vai bem debaixo do sol, o tanas. Os livros j escritos (meus e teus) demandam um auto-de-f. Os no prelo, j no me do gozo antes mesmo de virem ao pblico. E ainda hei de escrever outros tantos, mais por desaforo intelectual do que pelo engenho e arte. Um pecador precisa da mo de me na cabea, banho de ervas e bno de pai-de-santo, que ningum de ferro. Depois, o astral por aqui no lembra ao diabo
Falando em cumprir anos
Diz-me o Pranchinha (sempre a provocar) que o pior dos anos a festa de aniversrio. No falo do arroz de pato da dona Mindoca, que divino. Ou, de um certo prisma, profano. Nem falo da famlia que o nico abrao existencial que Deus permite ao pecador. Mas da pirosa vela acesa, como um farol, no topo do bolo. Do ambiente ruidoso, numa hora que se quer zen, paz, nirvana. E dos vrios tipos de amigos que o prprio Pranchinha descreve assim: amigos simples, amigos verdadeiros e amigos da ona. Os amigos simples levam uma garrafa de tintol para festa. Os amigos verdadeiros chegam mais cedo, ajudam a cozinhar e ficam at mais tarde para ajudar a limpar. E os amigos da ona fazem tudo isso, e ainda arrasam a garrafeira, vomitam no tapete e dormem atrs do sof at o day after pela manh, quando a empregada os encontra. E a s faltaria mesmo o General Palanque a danar sapateado em cima da mesinha da sala. Ou, ento, o D.J., em vez de msica, a soltar no rdio as discusses acesas e outros reportrios do Parlamento. Pode? O pior dos anos de facto a festa de aniversrio
Filhos e livros ou vice-versa
Mas no me liguem muito, nem me levem tanto a srio. Foi uma nuvenzinha que passou. Coisas da idade. Ademais, isto de viver apartado do Denzel (este j quase um adolescente) tem muito que se lhe diga. O Pablo ocupa-me uma metade, mas a outra metade fica-me vazia. Ou to-somente cheia de nostalgia. Copo meio cheio ou meio vazio, eis a questo. Recolho dados para uma antologia potica a sair em torno do 5 de Julho. O ttulo ser 30 anos da poesia moderna cabo-verdiana. Ou A potica de quando a vida nasceu. Quero perfilar os melhores poemas cabo-verdianos das ltimas trs dcadas e deixar isso como uma obra singela, em tributo Independncia Nacional. Outrossim, est pronto o livro Das Hesprides (fotografia, verso e prosa) sobre Cabo Verde, editado pela Universal Frontier. O livro ser distribudo no mercado portugus pela Caminho. Ainda para este ano o livro S/Cem Margens ou quando o Zero faz das suas. Para dar sada, em formato livreiro, estas crnicas descontnuas. Quanto ao resto, tudo continua ao Deus-dar.
Domingo
De manh, vi um show de Toquinho e de Chico Buarque no DVD, em casa do meu pai. Falou-se de tudo e de nada, mas ficou aquela passagem sobre Eduardo Loureno. Falou-se tambm da estratgia para a antologia, com paralelos nos j feitos, aos quais devo reverncia. Durante a tarde, o Pablo virou o dono da festa. Passeamos pelos stios que nem conto. Numa de mano a mano.
noite, hora light de tomar uma caipirinha, sumo de caju ou de tudo que se possa imaginar, e de jogar xadrez, ou domin, ou pacincia, ou simplesmente declamar versos de Fernando Pessoa. Mas no se preocupem (coisas do Pranchinha, meio porn o gajo), nem tudo isto exactamente verdade
segunda-feira, 17 de janeiro de 2005
Das frutas serenadas
Romãs
“Não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!”
David Mourão-Ferreira
Amor, não tarda que as romãs
sejam aqui frutas da época
e o irmos à loja da esquina
- do Ambrósio, como sabes –
flagrantes agora de lilases
(tão simplesmente frísias, lá estás tu)
ou framboesas das que também comíamos.
Não tarda, Amor, que, alados,
desmedidos no alarde das sombras,
nos tornemos destas apenas névoa,
quem sabe se nesta ou noutra vida
saibam aos beijos este travo das maçãs,
e o que se debruça no peitoril aos gritos
- os teus seios de ver, as tuas mãos nas minhas,
as romãs – e, tão rente à boca, tanta fome
(ou, Amor, sede, diria) que te guardo…
sejam aqui frutas da época
e o irmos à loja da esquina
- do Ambrósio, como sabes –
flagrantes agora de lilases
(tão simplesmente frísias, lá estás tu)
ou framboesas das que também comíamos.
Não tarda, Amor, que, alados,
desmedidos no alarde das sombras,
nos tornemos destas apenas névoa,
quem sabe se nesta ou noutra vida
saibam aos beijos este travo das maçãs,
e o que se debruça no peitoril aos gritos
- os teus seios de ver, as tuas mãos nas minhas,
as romãs – e, tão rente à boca, tanta fome
(ou, Amor, sede, diria) que te guardo…
Mangas
Não te quis contar tudo das mangas,
antes balbuciei aos teus ouvidos o luar
que, da fresta dos coqueiros, banhava
o areal silencioso, pedaços de notas
com que a brisa desejava as ondas,
o termos sido, mano a mano, essa loucura!
Das mangas não, Amor. Tão íntimas de nós,
pedras soletradas, tão de toda a fruta
(cá dentro) como foram os abraços
e a nudez que não nos acabava, senão
nas pétalas de uma flor serenada
e nesses murmúrios (soubeste-os sempre)
das mangas…
Filinto Elísio
antes balbuciei aos teus ouvidos o luar
que, da fresta dos coqueiros, banhava
o areal silencioso, pedaços de notas
com que a brisa desejava as ondas,
o termos sido, mano a mano, essa loucura!
Das mangas não, Amor. Tão íntimas de nós,
pedras soletradas, tão de toda a fruta
(cá dentro) como foram os abraços
e a nudez que não nos acabava, senão
nas pétalas de uma flor serenada
e nesses murmúrios (soubeste-os sempre)
das mangas…
Filinto Elísio
sábado, 15 de janeiro de 2005
Amor e Sexo
Rita Lee
Amor é um livro - Sexo é esporte
Sexo é escolha - Amor é sorte
Amor é pensamento, teorema
Amor é novela - Sexo é cinema
Sexo é imaginação, fantasia
Amor é prosa - Sexo é poesia
O amor nos torna patéticos
Sexo é uma selva de epiléticos
Amor é cristão - Sexo é pagão
Amor é latifúndio - Sexo é invasão
Amor é divino - Sexo é animal
Amor é bossa nova - Sexo é carnaval
Amor é para sempre - Sexo também
Sexo é do bom - Amor é do bem
Amor sem sexo é amizade
Sexo sem amor é vontade
Amor é um - Sexo é dois
Sexo antes - Amor depois S
exo vem dos outros e vai embora
Amor vem de nós e demora
segunda-feira, 10 de janeiro de 2005
Além Alma
Paulo Leminsky
Meu coração lá de longefaz sinal que quer voltar.Já no peito trago em bronze:NÃO TEM VAGA NEM LUGAR.Pra que me serve um negócioque não cessa de bater?Mais parece um relógioque acaba de enlouquecer.Pra que é que eu quero quem chora,se estou tão bem assim,e o vazio que vai lá foracai macio dentro de mim?
As Tábuas de Madeira
por José António Gonçalves
Dêem-me as tábuas,
Essas tábuas de madeira firme
Com que se constróem os barcos.
Dêem-me as tábuas rijas do tempo,
As tábuas livres e cantantes de madeira
Com que se erguem os muros fortes
das cidades inexpugnáveis.
Deixem-me juntá-las às folhagens
Do despojamento da sua condição de árvores.
Com elas, prometo,
Irei vigorosamente alicerçar,
No entrelaçar das tempestades
Que se lêem nos intervalos das nuvens invernais,
As jangadas calmas
Que respondem nas manhãs de nevoeiro
Pelo simples nome de casas.
Depois, se verdadeiramente me apetecer,
Decoro-as com dois pares de asas
e deixo-as voar.
A promessa permanece no poema.
Deixemos as casas, na sua condição de jangadas,
Cumprir com a sua missão de navegar.
Dêem-me as tábuas,
Essas tábuas de madeira firme
Com que se constróem os barcos.
Dêem-me as tábuas rijas do tempo,
As tábuas livres e cantantes de madeira
Com que se erguem os muros fortes
das cidades inexpugnáveis.
Deixem-me juntá-las às folhagens
Do despojamento da sua condição de árvores.
Com elas, prometo,
Irei vigorosamente alicerçar,
No entrelaçar das tempestades
Que se lêem nos intervalos das nuvens invernais,
As jangadas calmas
Que respondem nas manhãs de nevoeiro
Pelo simples nome de casas.
Depois, se verdadeiramente me apetecer,
Decoro-as com dois pares de asas
e deixo-as voar.
A promessa permanece no poema.
Deixemos as casas, na sua condição de jangadas,
Cumprir com a sua missão de navegar.
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