quarta-feira, 25 de janeiro de 2006

Os desgovernados

Sobre aquela praia

Como se a espiral desse agora mais uma volta, assim eles se encontraram tantas luas passadas sobre aquela praia. Que o passado esteja morto e enterrado. E dele fique lembranças, ora boas, ora nem por isso, mas sempre cândidas de mãos fadadas para um reencontro. Esquecidos da elementar cautela, os desgovernados amaram-se pela madrugada e a sorte, que sempre inveja, soube serenar o seu ímpeto de maldade. O amor é o melhor que há nas nossas vidas, escrevera ele em tempos distantes, noutras paragens. E ela então prometida ao destino suspirava o derradeiro encontro, como se de “Amor em Tempos de Cólera”, de Gabriel Garcia Marquez, tudo se tratasse. E a espiral, cumprindo mais uma volta, fez do fugaz o que a vida tem de eterno. Mesmo que soletrada sobre aquela praia…

Um novo mundo é possível

Em tempos de campanha eleitoral, a crónica fica entontecida. O texto tem de se apartar das tentações e o cronista fica esquizofrénico. Por isso, ele fala de amor, que é a mais profunda forma de subverter as coisas. E por falar de amor, acontece neste momento o Fórum Social Mundial, desta feita na Venezuela. O Fórum se define como um espaço mundial de debate democrático de ideias, aprofundamento da reflexão e formulação de propostas que se opõem à ditadura do capital. Vale a pena conferir esta cosmovisão no Site: www.forumsocialmundial.org.br . Nele li um extraordinário discurso de Hugo Chaves sobre Sandino, Simon Bolívar e Pancho Vila. Não só o texto retórico estava impecável, como a semântica era toda conseguida. Nestes tempos em que a América Latina retorna às lideranças necessárias, valerá a pena acompanhar o mundo com uma visão mais alargada e crítica. O nosso olhar não pode ficar confinado às eleições portuguesas, desaguadas em Cavaco Silva, mas têm de extravasar para mais além. Céu é grande, mundo é largo…


Águas passadas…em festa

Acontece a qualquer um embriagar-se numa vitória eleitoral. Logo eu que sou fã de Kundera e tenho sempre à mão “O livro do riso e do esquecimento”. Pois, dizia, acontece a qualquer um saltar, sorrir, dançar e gritar vivas. Quem diria, eu que não vou à procissão, nem à manifestação. Eu que vejo a vida e a morte, como um albatroz, convencido que o poeta nunca foi deste mundo. Mas esse celebrar transcendeu a um devaneio passageiro. Sofri a cada hora da campanha, a cada minuto da contagem dos votos e a cada segundo do anúncio dos resultados. Não nego que essas eleições mexeram com a minha estrutura muito mais do que eu gostaria de admitir. Pelo sim e pelo não. Por isso, são águas passadas…em festa!





O gado em raiva & já faltou mais


Soube, por travessas portas, que o gado continua raivoso. Há quatro anos raivoso. A destilar alcatrão quente pelas ventas e a vociferar mil pragas contra o alter-ego do Pranchinha. Este também não é flor que se cheire. Tão logo diluído no esquecimento, volta à carga, atiçando os do palanque para o diálogo dos dias. Pôr as ideias a circular é o apanágio dos democratas, razão porque não se compreende que o gado continue tão neurótico. Tendo o vulgo indagado as razões de tamanho fiasco, o Pranchinha respondeu, com aquele humor de espantar catedrais: “O efeito ‘manito bomba’ é de feitiço contra feiticeiro, ó minha gente”. Mas não tardará muito para que possamos voltar à normalidade. As eleições são necessárias, porque dão oxigénio à democracia, mas cansam. Exacerbam. O nosso espírito já pede algum remanso, algo como uma paz. De uma nuvem que se instala, linda como um algodão doce, diante do nosso olhar existencial…


Os desgovernados

Os desgovernados olharam o céu e aquiesceram. O que dirá o Zodíaco sobre o futuro e a angustiosa decifração dos enigmas? A tremeluzente cidade, adormecida, dolente na sua aparência. O arfar das horas monocórdicas e dos corpos assustados. O importante é haver vida e vivê-la com sentido. O resto…ondas que beijam a praia e depois partem. Liquefeitas, realizadas, saciadas…

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